sexta-feira, 10 de abril de 2009

Os rumos da Bienal em 15 páginas

Curadores da polêmica? Bienal do Vazio? entregam à instituição um extenso relatório com sugestões, rumos e metas

Camila Molina

Foi entregue na tarde de quarta-feira ao presidente da Fundação Bienal de São Paulo, Manoel Pires da Costa, e ao presidente de seu Conselho Administrativo, Miguel Alves Pereira, um extenso relatório, ao qual o Caderno 2 teve acesso. O texto está assinado pelos curadores da 28ª Bienal de São Paulo, Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen. No mesmo dia, foi realizada na Bienal uma reunião do conselho fiscal para apresentação das contas de 2008.

O relatório faz suas "recomendações" à instituição no que se refere a temas como administração, organograma, financiamentos, captação de recursos e serviço educativo (leia ao lado principais trechos). "A questão será sempre de organização, planejamento e recursos", escreveram os curadores. "Está claro que ela (Bienal de São Paulo) não pode continuar sendo uma benesse dada ao público por uma ação entre amigos, pois trabalha com dinheiro público", afirmaram, ainda, Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen na conclusão de suas 15 páginas.

Esse relatório foi concebido a partir da experiência dos curadores e do material de discussões promovidas pelos seminários durante a última bienal, que ficou conhecida como a Bienal do Vazio, por ter deixado desocupado todo o segundo andar do pavilhão de exposições.

Em breve, ainda sem data definida, haverá uma reunião com todos os conselheiros para a eleição do novo presidente da instituição. O nome cotado é Andrea Matarazzo, secretário de Coordenação das Subprefeituras do município de São Paulo. "É um excelente administrador, ele tem meu convite pessoal", afirmou Pires da Costa. Antes, foi convidado para o cargo o diplomata Rubens Barbosa. Segundo Pires da Costa, Barbosa não aceitou a candidatura porque não teria o apoio formal do poder público.

A entrega de um relatório detalhado sobre a 28ª Bienal estava prevista no projeto curatorial de Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen desde o início do evento, realizado entre 27 de outubro e 6 de dezembro. No relatório, o número de visitantes aparece como 162 mil pessoas.



PRINCIPAIS PONTOS DO DOCUMENTO


UMA DIVISÃO SEM SENTIDO: "No momento, é irrelevante se pode haver conselheiros vitalícios ou não. Antes, a questão é a composição do Conselho, como ele se articula para cumprir os objetivos da Fundação. Se os conselheiros não contribuem financeiramente para as operações da Fundação, conforme propunha o modelo de filantropia que criou o MAM e a Bienal nos anos 1950, então o que cabe ao Conselho é o gerenciamento dos trabalhos da instituição, a busca pela realização de seus objetivos. Assim, parece sem sentido a divisão entre Diretoria Executiva e a Presidência do Conselho."


MAIS EXPERIÊNCIA: "O que parece importante e procedente é uma nova composição do conselho, incluindo não apenas os amantes da arte e da cultura, mas também profissionais experientes como diretores de museus, curadores, artistas, galeristas, acadêmicos, que possam contribuir para um entendimento e uma presença mais orgânica da instituição na sociedade e no meio artístico brasileiro e internacional."


A FIGURA DO SUPERINTENDENTE: "O modelo de organograma que tem no topo um superintendente, no comando de setores e de profissionais para tarefas específicas como a curadoria, o planejamento e o desenvolvimento, a captação de recursos e marketing, produção, imprensa e RP, já foi adotado por gestões anteriores da Fundação. As 17.ª, 18.ª e 19.ª Bienais estão entre as poucas que, por exemplo, não apresentaram problemas de fluxo de caixa 60-90 dias antes da inauguração, graças ao planejamento do projeto."

A QUESTÃO DO ALUGUEL: "O uso do pavilhão para aluguel a feiras e eventos é o que parece garantir a folha de pagamento mensal de cerca de 30 funcionários, dedicados e colaboradores, que hoje trabalham na Fundação. Aparentemente, não há nenhum problema se for dentro de um processo criterioso, e também um meio de obter recursos para a exposição, arquivos históricos, benefícios ao prédio. Entretanto, esse procedimento parece ter gerado entre os funcionários (não todos, é claro) uma mentalidade que prioriza a feira, tomada como regra de organização, e a bienal como a exceção."

O DESGASTE DA IMAGEM: "A prática de realizar a mostra deixando dívidas para o próximo ano, a próxima bienal, não é boa para a imagem da Fundação, nem para o funcionamento de suas operações. Pior, algumas dívidas ficam sempre penduradas como, por exemplo, o prêmio recebido por Martin Puryear, em 1989, que até hoje não foi pago. O fato de a instituição se comprometer com projetos muito superiores à sua capacidade de captação de recursos parece evidente e é uma das causas de maior desgaste da imagem institucional da Fundação Bienal, afetando sua credibilidade como empregadora e pagadora."


PLANEJAR FINANCIAMENTOS: "Ao contrário de outras entidades que já trabalham a partir de estruturas profissionais e planejadas, dentro de programas definidos e regulares, a Fundação não tem quadros nem planejamento para esse setor, tão regulado e com dinâmica própria. Tampouco tem um cronograma adequado às suas atividades. Quando sai em busca de patrocínio para seus projetos, a Bienal sai em desvantagem, pois não pode oferecer um serviço regular ao patrocinador interessado. Faz isso apenas uma vez a cada dois anos. Por essa razão, ela muitas vezes recebe o que sobra de uma quantia anual definida pelas empresas."


MANTER A PERIODICIDADE: "De tempos em tempos surge a ideia de que a bienal deveria ser transformada em trienal ou quadrienal. O maior espacejamento entre as mostras não resolve questões financeiras e eventuais crises institucionais. Ao contrário, seria mais difícil ainda a captação de recursos. Apenas daria maior respiro entre o sufoco de duas exposições."