quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

BIBLIOGRAFIA: 15 longos minutos de fama


Quatro lançamentos comprovam a longevidade de Andy Warhol como fenômeno pop e contam como o artista construiu uma personalidade rentável e midiática


Andy Warhol, em frente ao bar Serendipity, em Nova York, em 1961



Andy Warhol gostava de se olhar no espelho para não ver nada. "Um crítico disse que eu era o nada em si, o que não ajudou muito", escreveu o artista. "Mas, se perguntassem qual é meu problema, eu diria: pele."

Homem que se tornou o nome mais conhecido da arte no século 20, Warhol odiava a própria cara. No mundo de celebridades que ajudou a arquitetar, criou um personagem magnético para ocultar suas falhas. Virou marca rentável até hoje.

Quatro livros lançados nos últimos meses do ano passado exploram o mito Warhol e repetem nas livrarias o alvoroço provocado pelas obras do artista pop em museus e galerias.

"Andy Warhol", de Arthur Danto, e "Pop - The Genius of Andy Warhol" (pop - o gênio de Andy Warhol), de Tony Scherman e David Dalton, são análises biográficas do artista. Enquanto o primeiro traça um paralelo entre Warhol e nomes atuais, como Jeff Koons, Damien Hirst e Takashi Murakami, o segundo mergulha nos detalhes da década de 1960, a fase mais produtiva de Warhol.

ANDY WARHOL
Autor: Arthur C. Danto
Editora: Yale University Press
Quanto: US$24(cerca de R$42) (192 págs.)

POP - THE GENIUS OF ANDY WARHOL
Autor: Tony Scherman e David Dalton
Editora: Harper Collins
Quanto: US$40(cerca de R$70) (509 págs.)

"I Sold Andy Warhol (Too Soon)" (eu vendi Andy Warhol cedo demais), de Richard Polsky, dá a dimensão de mercado da história, narrando o aumento dos preços das obras do artista em leilões e galerias.

POP - THE GENIUS OF ANDY WARHOL
Autor: Richard Polsky
Editora: Other Press
Quanto: US$24(cerca de R$42) (288 págs.)

Lançado no Brasil há dois anos, "A Filosofia de Andy Warhol", primeira tradução para o português do livro escrito pelo artista, se junta a "Popism" no segundo semestre, livro que ele fez com Pat Hackett, que redigiu seu diário a partir de conversas telefônicas.

A FILOSOFIA DE ANDY WARHOL
Autor: Andy Warhol
Editora: Cobogó
Quanto: R$43 (272 pags.)

Ele mesmo tinha preguiça de escrever. Se nas festas em Nova York Warhol era a figura midiática, de óculos escuros e cabelos arrepiados, não escondia o lado frágil quando estava entre seus assistentes. Era inseguro, inepto. Dependia até das duas empregadas guatemaltecas, que recolhiam os embrulhos de doces e chocolate em torno de sua cama todos os dias pela manhã.

"A maior coisa que ele fez foi criar esse personagem, como Buster Keaton ou Charlie Chaplin, um tipo clássico", diz David Dalton, autor de "Pop", que foi assistente do artista. "Ele criou uma imagem indelével, virou o oposto do que era."

Dalton documentou a construção e o sucesso dessa segunda pele e agora vê seu livro chegar às listas dos mais vendidos.

"Ele era como o Mickey Mouse", diz Arthur Danto. "Ninguém sabia como era a cara dos outros artistas, mas todo mundo consegue desenhar o rosto de Warhol." No auge da fama, o artista chegou a contratar um sósia para dar palestras e fazer aparições em seu lugar.

Foi por seu "charme profundo", nas palavras de Danto, que Warhol chegou à condição máxima de celebridade, despertando adoração e ódio. Anos antes de John Lennon, sofreu um atentado. Levou tiros calibre 32 no baço, estômago, fígado, esôfago e nos pulmões. Sobreviveu, sabendo que passava a ser também um mártir.

Pouco importa que Valerie Solanas, a psicótica autora dos disparos, não tivesse o artista como alvo. "A beleza ameaçada fica mais bela", escreveu Warhol após o episódio. "Se eu não fosse famoso, não teria levado tiros por ser Andy Warhol."

"Ele é como os Beatles", diz Richard Polsky. "Todo livro lançado sobre ele é um sucesso de vendas, as pessoas compram tudo com o nome Warhol."

Tanto que, quando Polsky comprou uma obra de Warhol, escreveu um livro narrando o episódio. Um colecionador finlandês ficou de olho no trabalho até que o autor decidiu leiloar a obra descrita no livro cinco anos depois. "Ele tinha lido o livro, pegou um jatinho e veio comprar o quadro em Nova York", lembra Polsky, que fez outro livro sobre a venda.

Entre as muitas teorias e poucas explicações concretas para o fenômeno Warhol, ele mesmo resume a questão numa frase: "Isso é porque as pessoas, mais do que qualquer outra coisa, querem estrelas".


Silas Marti da Folha de S.Paulo

BIBLIOGRAFIA


Livros falam sobre a vida de grandes nomes da arte contemporânea

Silas Marti da Folha de S.Paulo

Foi pelo outro lado da câmera que Matthew Barney virou artista. Pagou o curso em Yale com o dinheiro que ganhou como modelo, posando para a Ralph Lauren. Cindy Sherman transformou um "divórcio doloroso" em bonecas mutiladas.

Com a voz dos artistas, livro retrata a arte contemporânea

No Brasil, Cildo Meireles lembra a alucinação que teve aos seis anos de idade, paralisado numa cama. Cao Guimarães descobriu o "desejo pelo proibido" quando viu o arquivo de fotos do avô médico, com xifópagos e vítimas de barriga d'água. A prisão do marido, na ditadura, também foi motor para a obra de Anna Bella Geiger.

Dois livros lançados agora exploram a biografia dos maiores nomes da arte contemporânea no Brasil e no exterior. Buscam nos relatos desses artistas o lastro para a produção que inundou o mercado e arrebatou a crítica ao mesmo tempo.

Em "As Vidas dos Artistas", Calvin Tomkins, crítico de arte da "New Yorker", perfila dez artistas que viraram grifes, entre eles Matthew Barney, Damien Hirst, Jeff Koons, Richard Serra. Nos trópicos, Felipe Scovino lança "Arquivo Contemporâneo", coleção de 13 entrevistas com gigantes da arte brasileira --Cildo Meireles, Tunga, Adriana Varejão.

AS VIDAS DOS ARTISTAS
Autor: Calvin Tomkins
Editora: Bei
Quanto: R$ 57 (280 págs.)

ARQUIVO CONTEMPORÂNEO
Autor: Felipe Scovino
Editora: 7Letras
Quanto: R$ 48 (310 págs.)

Fazem uma análise sintética da última geração de criadores alçados à condição de celebridade. Dão a palavra aos próprios artistas, que esquadrinham desde o sucesso em leilões e galerias à presença nas maiores exposições do planeta e estripulias no plano pessoal.

Tomkins, 84, partiu com a missão de separar o joio do trigo. De milhares de artistas que conheceu, escolheu os que julgou pertinentes. "Um resultado da liberdade ilimitada na arte é a superprodução de coisas medíocres", constata o autor, em entrevista à Folha. "Essa situação tem atraído muitos não artistas, que acham que fazer arte é coisa fácil."

Ele tenta provar o contrário narrando a odisseia de Damien Hirst atrás dos tubarões e vacas que mergulhou em formol. Lembra a viagem ao deserto do Arizona para ver a cratera de luz de James Turrell, os excessos de maquiagem, roupas e perucas de Cindy Sherman.

No meio do caminho, sobra tempo para falar dos amigos roqueiros de Hirst, como o baixista do Blur, Alex James, do romance de Cindy Sherman com o ator Steve Martin, do egocentrismo embaraçoso de Julian Schnabel, da briga de Richard Serra com Frank Gehry.

São ecos da era que começou com Andy Warhol e o culto à personalidade que passou a valer também nas artes visuais.

É um contraste gritante com a situação brasileira. Enquanto os Estados Unidos viveram o boom econômico do pós-guerra, artistas nacionais extraíram forças da repressão militar. A máxima de Hélio Oiticica --"da adversidade vivemos"-- se ajusta quase com perfeição aos relatos dessa geração.

Cildo Meireles esmiúça o contexto em que circulou suas garrafas de Coca-Cola com mensagens subversivas. Cao Guimarães lembra como fazia todos os filmes na cozinha de seu apartamento em Londres.

Oiticica e Lygia Clark, pioneiros da arte invendável, surgem como grandes referências dessa geração, mas não evitaram que, mesmo no Brasil, tudo se rendesse ao mercado.

Artista que desponta lá fora, Adriana Varejão conta que a única lembrança que tem da primeira vez que viu a obra de Clark é o autógrafo que ganhou da artista. Meireles reduz tudo a um "universo do fetiche".

Na obra de Cindy Sherman, Tomkins vê o que se aplica à situação atual _o desejo de se agarrar "às coisas, à juventude, ao glamour, à esperança".