sexta-feira, 25 de setembro de 2009

A praga do Curadorismo

Sem obras, mostra em SP atesta importância crescente do curador no circuito; críticos e artistas reclamam dessa tendência



Silas Martí da Folha de S. Paulo



Quase um ano depois do vazio da última Bienal de São Paulo, começa em outubro outra mostra sem obras de arte. O Paço das Artes pretende expor 150 projetos de artistas e curadores -esboços do que seriam obras ou futuras exposições, ainda no estágio do rascunho.
"Muita gente diz que não aguenta mais exposição sem obra", diz Roberto Winter, um dos curadores da "Temporada de Projetos na Temporada de Projetos", nome redundante da mostra-provocação. "A gente também acha que vai ser chato, uma coisa monótona", adianta.
A monotonia se junta no início de outubro à radicalidade do Panorama da Arte Brasileira, no Museu de Arte Moderna paulistano, que desta vez vetou artistas brasileiros na mostra.
São indícios no cenário artístico da influência crescente dos curadores, que às vezes ofuscam os próprios artistas -o que muitos no meio já apelidaram de "praga do curadorismo".
Em viagem a Istambul, o curador do Panorama, Adriano Pedrosa, enviou por e-mail considerações sobre curadores-autores. "Uma exposição é sempre determinada ou limitada por experiências de vida, perspectivas, conhecimentos [do curador]", dizia. Não respondia questões da reportagem, mas elencou declarações em inglês sobre o assunto e pediu para conferir a tradução.
"Existe muito ego", opina Agnaldo Farias, um dos curadores da próxima Bienal de São Paulo. "São esses momentos quando o trabalho se volta muito para o próprio meio artístico."
Foi essa a principal acusação contra o gesto dos curadores Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen de deixar vazio um andar inteiro do pavilhão da Bienal no ano passado. "As pessoas querem ver arte, ninguém está muito a fim disso", afirma o crítico Tiago Mesquita, que não autorizou a exposição de seu projeto no Paço das Artes.
"Fizeram a curadoria da curadoria; era demais", diz Mesquita. "Curador não é artista, ninguém vai lá ver curador."
Um dos dois brasileiros a passar pela peneira da curadoria e entrar no Panorama deste ano, Valdirlei Dias Nunes diz que "sem dúvida, o nome do curador aparece muito mais do que qualquer artista até agora". Dias Nunes só entrou para a exposição por indicação de um artista argentino.
Nos anos 80, Lisette Lagnado, curadora da Bienal de São Paulo de 2006, já perguntava em artigos se os curadores seriam as novas estrelas da arte. Em texto recente publicado no site "Trópico", afirma que "no Brasil a crescente demanda por curadores independentes alcançou um nível epidêmico desproporcional à realidade das coleções dos museus".
À Folha, Lagnado disse depois que nunca recebeu tantos convites para participar de debates sobre curadoria no país. Enquanto isso, universidades e museus vêm turbinando seus cursos para formar curadores.
"Há um risco hoje em dia de o curador tomar o lugar da obra que ele cura", diz o artista Nuno Ramos. Carlos Fajardo também vê uma importância crescente do curador, mas diz que é "impossível" fugir a essa lógica.
Apontado como um dos nomes centrais dessa nova geração, o titular da próxima Bienal de São Paulo, Moacir dos Anjos, tenta definir melhor os papéis. "Curador é curador, artista é artista", resume Anjos. "Sempre existe um grau de autoria numa exposição, mas isso não faz do curador um artista."
Mesmo quando esse curador acaba mais falado do que a própria exposição. Ivo Mesquita não se desvencilhou do pavilhão vazio. Sheila Leirner pôs a Bienal de São Paulo no mapa quando decidiu expor lado a lado as grandes telas da geração 80, num compêndio expressivo da volta à pintura. Teixeira Coelho atiçou a ira de público e artistas quando espalhou telas pelo chão do Itaú Cultural.
"Nossa proposta é mais autoral mesmo", admite Luiza Proença, parceira de Roberto Winter na curadoria da mostra de projetos no Paço. "É provocativo, mas artistas dependem dessa provocação", diz ela, que quando não ocupa o papel de curadora, também é artista.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Pipilotti Rist no Paço das Artes

Corpo é trampolim para , que expõe no Brasil em outubro

Fernanda Ezabella da Folha de S.Paulo

Vulvas vistas tão de perto que deixam de ser vulvas, se transformam em apenas superfícies úmidas e vermelhas, percorridas por uma câmera como se "procurasse ouro", descreve Pipilotti Rist. A descrição pode chocar algum espectador, mas não é esse o objetivo da artista suíça, que usa o corpo como base para muitos de seus vídeos. Ela está somente em busca da poesia da imagem.



A artista Pipilotti Rist surge no vídeo "Alma Perdida em uma Banheira de Lava"
"O que mais temos além do nosso corpo?", pergunta Rist, 47, em entrevista à Folha por telefone, de Zurique. "Ginas Mobile" (2007), que registra em close quase microscópico cinco vulvas, está entre as dez videoinstalações em exibição no Museu Paço das Artes, em São Paulo, a partir de 6/10. A artista chega amanhã à cidade para sua terceira visita ao país. Ela falará com o público da mostra e depois seguirá numa viagem por Minas Gerais.
Mas Rist, uma das pioneiras da segunda geração da videoarte, tem sim muito além do corpo para criar suas engenhosas videoinstalações. Ela conta com uma equipe para ajudá-la em projetos às vezes um tanto complicados, como levar imagens para tetos de igrejas repletos de afrescos, para o chão de museus ou mesmo pelo corpo do espectador. Registros da natureza também são importante fonte de suas imagens poéticas.
"Podemos usar as luzes, os movimentos do vídeo para nos confortar. Você se senta e coloca as imagens para passear por sua pele, é como alguém te acariciando", diz Rist sobre o trabalho "Laplamp" (2006), que projeta plantas no colo do espectador. "A imagem eletrônica é tão onipresente em nossa vida e sempre a deixamos numa única direção, olhamos sempre para dentro de uma caixa. Nós devíamos libertar esses fantasmas, misturá-los mais com o nosso cotidiano."
Assim como não tem medo do corpo, Rist também não teme as cores, peça fundamental de sua vida. Ela é sempre vista com roupas de cores vibrantes e faz delas tema de pesquisa pessoal. "Por que os europeus têm mais medo das cores do que os brasileiros têm?", ela pergunta durante a entrevista. "Não concorda que as cores estão muito ligadas a emoções?"
É para responder perguntas como essas que ela fará uma viagem de duas semanas por cidades históricas mineiras, com uma parada estratégica em Brumadinho, no Centro de Arte Contemporânea de Inhotim.
Ela negocia levar à cidade a obra "Homo Sapiens Sapiens" (2005), exibida numa igreja de Veneza e filmada nos jardins do próprio centro mineiro, em 2005. Uma continuação desse trabalho estará no Museu da Imagem do Som, ao mesmo tempo em que a mostra no Paço das Artes. A atriz polonesa Ewelina Guzik volta a ser Eva em "Liberty Statue for London" (2005), também projetado no teto da instituição.
"Em "Homo Sapiens Sapiens", ela [Eva] estava no paraíso, cercada de homens, todos pelados, e na "Liberty Statue" ela volta à civilização, 40 mil anos depois. Ela está vestida, tentando se balancear entre natureza e civilização, sem se sentir culpada", explica.

John Lennon

Outra faceta da obra de Rist é um certo tom anárquico, que pode ser visto numa de suas instalações mais famosas, "Ever Is Over All" (1997) --uma mulher caminha alegremente, em câmera lenta, destruindo janelas de carros estacionados, com uma espécie de flor.
Apesar do forte apelo feminista, o trabalho de Rist começou por influência da música e da cultura pop. Vídeos cômicos como "I'm Not The Girl Who Misses Much" (1986), uma releitura bem esquisita da canção "Happiness is a Warm Gun", de John Lennon, ou "You Called Me Jacky" (1990), no qual a artista dubla outra música, estarão na instalação "The Room" (estão no YouTube também).
"A música está muito próxima à batida de nosso coração, ao interior de nosso corpo", diz Rist, que no início dos anos 80 fazia experimentos com Super-8 e projeções de slides em shows de seus amigos músicos.
A inspiração para tantas fantasias, ela conta, vem de seus sonhos, que ela anota e desenha. "Minha profissão é manter os olhos fechados e levar essas imagens a sério. Materializá-las num filme", diz, rindo.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Crítica: A cruzada cinzenta de Kassab



A mesma onda proibitiva que apaga grafites não atinge o vale-tudo das leis de zoneamento

por Rodrigo Andrade

O episódio recente em que a prefeitura de São Paulo apagou os grafites e pichações dos muros da Avenida 23 de Maio, pintando-os de cinza, revela a tendência maníaca por ordem que caracteriza a gestão Gilberto Kassab. Tendência que resulta mais de moralismo do que de inteligência. É a mesma tendência que recentemente espalhou nas ruas um monte de ilhas e/ou blocos de concreto que "disciplinam" os cruzamentos, estreitando as passagens e obrigando os motoristas a seguir e dobrar as esquinas da "maneira correta", dificultando o fluxo do tráfego em nome da ordem e dos bons costumes no trânsito e de uma aparência de cidade bem cuidada. Pode ser inteligente em termos eleitorais, mas não como solução prática, pois além de atrapalhar, o custo dessas ilhas poderia ser aplicado, por exemplo, na limpeza da cidade, que está longe de ser exemplar.

O prefeito Kassab notabiliza-se por investir grandes esforços em ações com a aparência da cidade. A lei que removeu as propagandas, placas e luminosos das paredes, fachadas de lojas, bares etc. teve um enorme impacto na cidade e deu muitos pontos ao prefeito. O impacto foi positivo, pois a cidade recuperou os contornos de uma fisionomia que estavam ocultos, soterrados por pesado lixo visual. Mas também trouxe perdas, já que privar São Paulo do brilho colorido dos neons, típica de grandes centros urbanos, é um tanto cruel.

Basta pensar na Times Square em Nova York, ou Piccadily Circus em Londres, ou Tokio. Com a lei, uma visualidade muito característica nossa se perdeu. É o caso da popular loja de sapatos Zapata, na Duque de Caxias, que tinha um imenso luminoso de neon com letras gigantes sobre uma fachada de perfilados de alumínio tão típica nossa. A retirada trouxe à luz a arquitetura do prédio (sem graça, diga-se) e um silêncio visual confortável, mas empobreceu e entristeceu aquela esquina. Talvez a lei devesse ser flexível, e permitir os neons em certos lugares (como em Londres e Nova Yorque, aliás). Acontece que aqui as leis são aplicadas sem bom senso. Creio se tratar de uma dificuldade em viver com regras, sem que para isso seja necessária a proibição total. É a proibição ou o vale-tudo.

Vivemos uma onda proibitiva sem precedentes em São Paulo. Só que essas proibições não atingem o vale-tudo das leis de zoneamento, uma questão crucial, e enquanto a prefeitura pinta de cinza muros com grafites ou constrói irritantes ilhotas nos cruzamentos, bairros como a Vila Romana, onde moro, estão sendo completamente transfigurados pela voracidade imobiliária, com incessantes construções de prédios de apartamentos que em pouco tempo tornarão este simpático bairro num inferno sem sol, sem gente andando pelas ruas - só carros - de trânsito pesado sem escoamento possível, dificuldade para estacionar e medo da violência. Para impedir esse verdadeiro crime urbano bastaria que o bom senso regulasse o crescimento da cidade, estipulando regras de construção adequadas (determinando, por exemplo, a altura máxima dos edifícios) e porcentagens razoáveis de reocupação, em vez da proibição pura e simples.

Quanto aos grafiteiros e pichadores, no ano passado houve dois episódios envolvendo ações coletivas que merecem consideração. Um na escola de Belas Artes e outro na Bienal. Em ambos os casos a ação foi violenta, truculenta e oportunista, explorando o evento com o simples propósito de autopromoção mediante argumentos capengas, se justificando com pseudo-conceitos como "questionamento dos limites da arte" e "liberdade de expressão", supostamente pertinentes numa discussão e num espaço "de arte". E a suposta posição de "vítimas do sistema" caía no ridículo do jogo de cartas marcadas da ação, da esperada repressão e a consequente repercussão na mídia (e o pior é que a estúpida e absurda prisão de uma pichadora dava consistência a essa posição de vítima). Essas ações deturpavam o próprio sentido das pichações como intervenções urbanas.

Muito diferente é ver a lateral cega de um prédio novinho, branquinho, marcado com aquela curiosa tipografia das pichações. Vandalismo, sem dúvida, mas ali eu vejo também um caráter subversivo divertido, manifestação de uma cultura urbana adolescente genuína e espontânea. Algumas são verdadeiras proezas. Devem ser naturalmente proibidas, mas já ouvi que, para os pichadores, sem a adrenalina proporcionada pela proibição não teria graça. Mas no caso dos belos grafites nos muros da 23 de Maio - uma via expressa árida - francamente, ali me parece o lugar mais adequado possível para eles e não há razão para proibi-los.

Mas Kassab viu uma oportunidade de empreender sua cruzada cinzenta. Cruzada que também se manifesta nas obras das calçadas da Paulista, onde mais de cem árvores foram simplesmente retiradas! Será que é para não precisar varrer as folhas secas que "sujam" as calçadas? Falta massa cinzenta para esses amantes do cinza que tem em Kassab um fiel representante. Viva os grafites, viva os neons, viva Zapata!

*Rodrigo Andrade é artista plástico

Trienal africana vem a São Paulo e Salvador


Silas Marti da Folha de S.Paulo

Terá braços em São Paulo e Salvador a próxima Trienal de Luanda, maior mostra de arte contemporânea africana, que começa em setembro de 2010 na capital angolana, com um orçamento de US$ 3 milhões.

Detalhe de tela de Mustafa Maluka, que estará na mostra de arte angolana

Nesta segunda edição, o curador Fernando Alvim, que organizou o primeiro pavilhão de arte contemporânea africana na Bienal de Veneza há dois anos, pretende estabelecer uma nova geografia para a arte do continente, estreitando os laços entre Angola e Brasil.
Embora a mostra principal em Luanda esteja marcada só para 2010, uma peça de teatro --"As Formigas", de Boris Vian-- e apresentações da banda Next dão largada à Trienal em São Paulo já em novembro.
Também integra a programação a exposição "Smooth and Rave", com artistas africanos contemporâneos, que ocupam em novembro a galeria Soso, no centro de São Paulo.
De frente para a galeria, um hotel desenhado por Ramos de Azevedo terá cada quarto convertido em videoinstalação a partir de maio de 2010, projeto dos curadores Jacopo Crivelli Visconti e Simon Njami.
"Não precisamos todos passar por Londres, Paris, Nova York para nos encontrar", diz Alvim. "É uma nova geografia que se está a instaurar entre São Paulo, Lisboa e Luanda."
Mais perto de Angola, a capital baiana será outro "epicentro" da Trienal. "Existe imensa conexão da África com o Brasil e ela se materializa por aqui", afirma Solange Farkas, diretora do Museu de Arte Moderna da Bahia, que levará a Luanda um recorte do festival Videobrasil. "A África é um ponto de referência; existe um desejo de trânsito, de uma aproximação muito forte e expressiva."
Parte importante dessa expressão será vista em vídeo, um dos suportes mais trabalhados pela nova geração de artistas africanos. "Tem um interesse em promover o vídeo", diz Farkas. "Usar o suporte como uma ferramenta de inclusão de artistas ainda faz sentido na cena artística angolana."
Outro ponto de ligação entre Salvador e Luanda é a exposição "Três Pontes", do curador Daniel Rangel, que fará no evento africano uma mostra sobre as conexões históricas e culturais entre as duas cidades.
"Quem é que nunca ouviu falar de cinema novo, do tropicalismo, em Luanda? Temos muitas coisas em comum para além da língua", diz Fernando Alvim. "Andamos muito à volta das cidades como base curatorial."
Além do Brasil, a Trienal de Luanda planeja mostras em cidades do mundo todo, como Londres, Nova York, Havana, Tóquio, Pequim, entre outras.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Obras de Dias & Riedweg, unidas pela ideia de paraíso

Vídeo sobre a cultura do funk carioca estão entre as obras da dupla em mostra no Instituto Tomie Ohtake

Marina Vaz, de O Estado de S. Paulo

O carioca Maurício Dias era pintor e gravurista. O suíço Walter Riedweg trabalhava com teatro e música. Em 1993, os dois se uniram em uma nova linguagem, o vídeo. De lá para cá, Dias & Riedweg já passaram por mostras internacionais de prestígio, como as bienais de Veneza (1999), Havana (2003) e São Paulo (1998 e 2002). Os trabalhos mais recentes da dupla você vê no Instituto Tomie Ohtake, a partir de quarta-feira (23), na mostra Paraísos Possíveis - Dias & Riedweg.

Depois de passar por 15 instituições mundo a fora, a mostra, com curadoria de Agnaldo Farias, traz ao Brasil dez instalações em que os artistas utilizam vídeo-performances, projeções e fotografias. Na instalação ‘Funk Staden’, Dias & Riedweg mostram um musical sobre o funk nas favelas cariocas. O roteiro foi feito com base em um livro de Hans Staden, o alemão que foi capturado por índios tupinambás no século 16. "Encenamos o livro como se os funkeiros fossem os índios, para falar de preconceito", explica Dias.
Em ‘Malas para Marcel’ (o Marcel em questão é o francês Marcel Duchamp), os artistas mostram projeções dentro de 12 malas. As imagens foram captadas por câmeras escondidas dentro de maletas espalhadas pelos artistas na cidade do Rio de Janeiro.

SERVIÇO

Onde: Instituto Tomie Ohtake. Av. Brig. Faria Lima, 201 (entrada pela R. Coropés), Pinheiros, 2245-1900. Quando: 11h/20h (fecha 2ª). Abre 4ª (23). Até 25/10. Quanto: Grátis.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Bienal de Lyon celebra o cotidiano


10ª edição tem trabalhos de tom político e quase foi adiada, em razão de desligamento de ex-curadora

Fabio Cypriano da Folha de S. Paulo


Seis crianças são vistas refletidas em um espelho, até que uma delas pega um estilingue do bolso e o quebra. Então, todas correm com os cacos e sobem numa imensa árvore. O forte sol faz com que os reflexos desses estilhaços brilhem, transformando-se, magicamente, na árvore.
"Per Speculum", projeção do albanês Adrian Paci, é não só a obra mais falada da 10ª Bienal de Lyon, aberta ontem para o público, como a que melhor sintetiza seu tema, "O Espetáculo do Cotidiano", organizada pelo curador chinês Hou Hanru e que fica em cartaz até 3 de janeiro de 2010.

Frame da projeção "Per Speculum", do albanês Adrian Paci

Frame da projeção "Per Speculum", do albanês Adrian Paci

A mostra chegou a correr risco de ser adiada, quando a curadora Catherine David, até então responsável pela Bienal, desligou-se da instituição, em fevereiro passado. Hanru, curador recordista em bienais - já esteve envolvido em 20- , foi convocado e aceitou.
"Tive medo, claro. Organizar uma bienal em seis meses é um grande desafio, mas convoquei muitos artistas com os quais já trabalho há muito tempo", disse ele à Folha.
Distribuída por quatro espaços da cidade, entre eles o Museu de Arte Contemporânea e a Sucrière (um antigo depósito de açúcar), a Bienal reúne 59 artistas, agrupados em quatro temas: A Magia das Coisas, Elogio à Deriva, Um Outro Mundo É Possível e Vivendo Junto.
"O Espetáculo do Cotidiano" almeja ser conceitual. "A crítica à sociedade do espetáculo nasceu na França, mas a arte contemporânea vive um constrangimento pela perda de pertinência intelectual em vista de sua crescente mercantilização", disse o curador.
Contra esse panorama, Hanru selecionou coletivos e trabalhos com caráter político, como "A Boa Vida", do colombiano Carlos Motta, com 400 entrevistas, em 12 cidades, entre elas São Paulo. Em seis monitores, pessoas comuns discutem o papel da democracia e dos governos.
A Bienal de Lyon possui ainda um outro vetor denominado Veduta, voltado à periferia da cidade. "Serão 390 eventos e um fórum, para criar um vinculo mais forte entre arte e sociedade", diz Thierry Raspail, diretor artístico de todas as edições da Bienal e do MAC.
George Brecht (1926-2008), membro do grupo Fluxus, presente na mostra com várias obras, torna-se outra importante inspiração. "Os eventos mais importantes são as pequenas coisas que ocorrem nas ruas", costumava dizer o artista.

SHIRIN NESHAT LEVA O LEÃO DE PRATA EM VENEZA

“A Bienal de Praga poderá ser a minha última bienal, o meu novo objetivo será fazer filmes”, afirmou a artista Shirin Neshat. De fato, a sua “descoberta cinematográfica” veio na forma de um Leão de Prata, que acabou de receber como melhor diretora em Veneza.


trailer - Women without Men (Mulheres sem Homens)

Na 66ª Mostra del Cinema, a artista iraniana apresentou a sua obra-prima Women without Men (que participou como vídeo-instalação na Bienal de Praga em 2007), uma longa-metragem inspirada pelo romance de Sharmush Parsipur. Neshat foi agraciada com o prestigiante segundo prêmio.

O projeto foi finalizado após um longo período e enormes problemas logísticos e de organização, sobretudo o grande nível de censura sob o qual o Irã vive. Por esta razão, a artista teve de contratar iranianos que vivem fora do Irã e a cena que se passa em Teerã, onde não é permitido filmar, foi feita num cenário construído no Marrocos.

O filme conta a história de quatro mulheres iranianas durante o golpe militar pelo qual Xá Reza Pahlevi chegou ao poder em 1953. Mesmo depois da passagem deavideoarte para o cinema, Shirin Neshat continua a analisar um dos seus principais temas: a condição social feminina na cultura islâmica.

Disponível em: www.flashartonline.com

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Artista cria mercado de pulgas para negociar segredos pessoais


Fazer compras sem dinheiro funciona em um único mercado de pulgas em Berlim, onde a moeda corrente são segredos pessoais. A artista responsável coleta depoimentos de seus clientes para construir uma peça radiofônica.

Para um modesto vestido de bolinhas verde e branco, a cliente tem que passar 10 minutos falando sobre moral e castidade. Um colar vale o relato de cinco minutos sobre um pequeno segredo sujo. E para levar para casa três livros, o interessado deverá dizer alguma coisa que nunca contou antes a ninguém.
"É claro que estou curiosa", conta Alexandra Müller, de 26 anos, idealizadora e organizadora do que chama de "mercado íntimo de pulgas", em Berlim.
Cada conversa com um cliente é gravada por ela, para ser posteriormente editada e usada na construção da dramaturgia de uma peça radiofônica. Os momentos mais apreciados pela artista são aqueles nos quais os clientes de seu mercado se esquecem de que ela está ali e continuam simplesmente falando de si mesmos.
Dar e receber
"Não acho que algum dia na vida conseguirei ter relações que funcionam", diz uma garota que prefere ser chamada de Sonja e que está interessada em levar para casa um boné verde. Por esse produto, ela "paga" com seis minutos de narração sobre uma ruptura amorosa. "Na minha última relação, tudo se desmoronou e a gente brigava todo dia. Foi uma separação lenta e dolorosa", diz a jovem frente aos gravadores da artista Alexandra Müller.
Nils, de 24 anos, por sua vez, tentou contar algum segredo nunca revelado anteriormente, a fim de levar em troca três livros usados. "Quando eu tinha 17 anos, era realmente muito importante ter experiência com garotas. Eu dizia a meus amigos que já tinha dormido com uma, mas não tinha. Inventei a história sobre um encontro num acampamento. Aquilo foi realmente embaraçoso para mim", relata o jovem.
Müller conta que uma outra mulher descreveu sua vida nas ruas como dependente de drogas. "E tinha uma francesa que não parava de falar e que descreveu durante 20 minutos seu jardim interno, sem que eu ao menos pudesse fazer perguntas. Foi realmente estranho", diz a artista, sempre disposta a ouvir os clientes por um intervalo de 5 a 20 minutos, dependendo do produto à venda.
O contato, porém, não é unilateral. Alexandra Müller também se dispõe a falar. Ela não só coleta segredos alheios, mas – em troca de suas próprias histórias pessoais – também compra produtos para revender em seu mercado. A fim de angariar um par de sapatos, ela discorreu sobre onde pensa estar vivendo daqui a 30 anos.
"Para mim, a arte performática sempre foi um meio de expressão, mas não necessariamente tem que ser sutil e abstrata. Pode significar apenas falar com pessoas normais e envolvê-las", comenta a artista.
Repensando a proteção de dados
A peça radiofônica baseada nesse mercado de pulgas inusitado não é o primeiro trabalho de Müller. Em abril de 2007, ela criou uma performance chamada Não chore. Trabalhe! Durante uma semana, a artista executou toda a espécie de trabalho que lhe pediam – exceto prostituição – e se surpreendeu sobre como as pessoas falavam sobre suas vidas, enquanto ela trabalhava para elas. "Eu tinha a sensação de que as pessoas compravam meu tempo", conta.
Müller acredita que, na era da informação, as pessoas estão mais dispostas a dividir informações pessoais. "Quero fazer com que as pessoas reflitam sobre como fornecem dados para os outros. Quando elas me contam histórias sobre suas vidas sexuais ou coisa parecida, têm a sensação de que estão revelando dados sobre si mesmas. Talvez em suas vidas reais elas também pensem assim", reflete a artista.

Um show, dois palcos

As performances de Müller começaram em agosto, em uma galeria de arte do bairro Prenzlauer Berg, em Berlim. No início de setembro, ela transferiu o projeto para uma antiga sede dos correios no bairro de Neukölln, onde deverá permanecer até 27 de setembro.
Esse novo ambiente combina especialmente com a concepção da artista. Afinal, as pessoas usam o correio para enviar cartas lacradas, nas quais escrevem seus segredos a amigos, entre outras coisas. Agora elas se dirigem ao mesmo local para se encontrar com a artista e contar segredos; no entanto, sem "lacrar" os mesmos.
Segundo Müller, outro detalhe importante do projeto são as performances em duas regiões bem distintas de Berlim. "Prenzlauer Berg é mais a Manhattan da cidade, um bairro muito descolado, com muita gente jovem. Neukölln é mais o Bronx de Berlim, onde vivem muitos estrangeiros", descreve a artista.
Pois, quanto mais variadas as histórias íntimas contadas, mais interessante se tornará sua peça radiofônica, a ser veiculada pela emissora alemã de rádio SWR.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Site vende e vigia direito de imagens de obras


Silas Marti da Folha de S. Paulo

Demorou 24 horas para retirar dois artistas brasileiros representados de forma ilegal de um site estrangeiro. A virtual Galerie Dada, com sede nos Estados Unidos e na Tailândia, oferecia reproduções de quadros de Antonio Henrique Amaral e Tarsila do Amaral, pintadas a óleo por "experientes graduados em belas artes".
É o mesmo site que oferece reproduções de trabalhos de Gauguin, Matisse, Picasso, Van Gogh, Miró, entre outros.

A cópia em tela de algodão com tinta Windsor & Newton de "Braziliana Litoral 2", quadro em que Antonio Henrique Amaral pintou um cacho de bananas, poderia ser vendida por algumas centenas de dólares.
Isso até que Cristiane Olivieri, do site InArts, respondeu ao alerta do próprio artista e disparou um e-mail ao portal, contando que detinha os direitos de uso daquela imagem.

"Não temos uma função policialesca, mas aquele era um uso criminoso da imagem", conta Olivieri. "Sabiam disso, tanto que receberam o e-mail e em 24 horas os artistas brasileiros já não estavam mais indicados."

No ar em fase de testes há um ano, o InArts representa o direito sobre imagens de trabalhos de 50 artistas. Não vendem obras de arte, mas cobram pela publicação de imagens delas em catálogos, livros e cartazes.

Enquanto esse é um trabalho comum de associações de artistas no mundo todo, o InArts é um dos primeiros sites a oferecer o serviço e a única empresa dedicada só a isso no país, com cada vez mais clientes.

Batalhas Jurídicas


Há alguns meses, herdeiros de Alfredo Volpi entraram em conflito com o Instituto Moreira Salles, que expôs obras do artista e tentava publicar imagens dos trabalhos num catálogo, que acabou saindo sem elas. O mesmo já aconteceu com Lygia Clark e outros artistas, o que motivou até um manifesto de curadores e críticos de arte contra herdeiros que cobravam demais pelas reproduções.

Valores, no caso de Volpi, chegam a R$ 150 mil, muito além do padrão internacional, e ameaçam que o artista fique de fora de mais um catálogo que deve ser publicado neste ano.

Na tentativa de tabelar os preços do mercado e evitar disputas jurídicas, o InArts estabelece valores objetivos a serem cobrados pela publicação de uma imagem, dependendo do tamanho da reprodução e a tiragem da edição em que o trabalho aparece -custos que variam de R$ 60 a R$ 2.000.

"Não é um valor que inviabiliza nenhum projeto, são bem razoáveis", diz Olivieri. "É uma maneira de a família conseguir fazer a manutenção do acervo, coisas que têm um custo."

Mesmo no caso de obras vendidas a outros colecionadores, herdeiros do artista continuam titulares dos direitos de imagem e podem cobrar por isso.

"É importante que o uso seja remunerado, porque a cadeia toda, do editor ao crítico que trabalha nos catálogos e nos livros, recebe pelo que faz", opina Olivieri. "A gente ajuda o artista a gerir um pedaço de sua vida, e ele fica livre para continuar no ateliê."

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Shirin Neshat: Cinema

'Mulheres sem Homens' revela a luta pela democracia no Irã

Belo filme da diretora Shirin Neshat conta de modo delicado a vida de quatro mulheres no Irã dos anos 50

Flávia Guerra, de O Estado de S. Paulo


A diretora iraniana Shirin Neshat usa verde em sinal de protesto contra o presidente de seu país, Mahmoud Ahmadinejada, acusado de fraudar as últimas eleições.

Sob mais de dez minutos de aplausos, a diretora iraniana Shirin Neshat agradeceu ao público que lotou a Sala Grande do Festival de Cinema de Veneza, após a exibição de seu filme Zanan Bedoone Mardan (Mulheres sem Homens). O filme, que conta de modo delicado e até mesmo surreal a vida de quatro mulheres no Irã dos anos 50, teve recepção mais que positiva durante a sessão de gala. O longa, que concorre ao Leão de Ouro, mostra, em paralelo, o período em que um golpe de estado, que teve apoio inglês e liderança norte-americana, derrubou o então governo democrático e restituiu o poder ao xá.

De manhã, a recepção da imprensa já havia sido emocionante. Diretora e equipe fizeram questão de usar lenços verdes em apoio ao movimento atual contra o atual presidente do país, Mahmoud Ahmadinejad, acusado de fraudar as últimas eleições.

Ao fim da sessão de gala, Shirin voltou a repetir que fez seu filme para que o mundo veja que o povo iraniano quer lutar pela democracia e pela liberdade. "E sobretudo as mulheres sempre lutaram por estes valores. Não importa o período, mostrar que a liberdade e a democracia são algo muito importante para os iranianos. Mais uma vez o verde deu o tom à sessão mais emocionada e emocionante do festival até agora.

Vale lembrar que, ainda que se passe em 1953, Mulheres sem Homens revela acontecimentos que influenciam até hoje a história do Irã. Após os golpe, o país se encaminhou para a Revolução Islâmica de 1979. Tal fato, por sua vez, conduziu o país ao governo de Ahmadinejad. "É até irônico como tudo foi uma coincidência. Mas de fato as cenas da repressão naquele 1953 são muito parecidas com as do último verão", comentou Shirin. "Há um século os iranianos lutam contra ditadores, que mudam de forma e ideologia. E tanto naquele período quanto hoje, nós mulheres somos símbolos desta batalha. Jamais esqueceremos a estudante Neda, que foi assassinada em pleno protesto, na frente do mundo todo", disse ela à plateia. E finalizou: "Nossa luta continua. E espero que este filme seja testemunho disso."

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Entrevista: Moacir dos Anjos


"Quero reavaliar a arte brasileira", diz curador da Bienal de SP


por Fabio Cypriano da Folha de S.Paulo


O curador pernambucano Moacir dos Anjos, 43, vai assumir sua curadoria mais ambiciosa, depois de obter elogios pela condução de mostras como a "Paralela", em 2004, e o "Panorama da Arte Brasileira", no MAM-SP, em 2007. A 29ª Bienal de São Paulo tem abertura marcada para setembro de 2010. O crítico de arte Agnaldo Farias vai ser o cocurador do evento.

Qual o papel da Bienal de São Paulo hoje?

Moacir dos Anjos - No âmbito internacional, contribuir para afirmar um modelo de exposição que guarde distância tanto do imediatismo que rege as feiras de arte quanto da estabilidade de valores que reina em museus. No contexto brasileiro, consolidar-se como instituição que, além de oferecer momentos de encantamento ao público, assuma com vigor sua missão crítica e formadora.

Pensando nesses dois temas --formação e encantamento-- quais Bienais paulistas se aproximaram do que você pretende organizar?

Dos Anjos - Das realizadas nas duas últimas décadas, creio que a 23ª (1996) e a 24ª (1998) foram as que melhor articularam essas duas dimensões que, acredito, devam estar simultaneamente presentes em uma exposição de arte.

Moacir dos Anjos, 46, será o curador da próxima Bienal de SP; ele quer "reavaliar a arte brasileira"

Numa pesquisa da Folha Online, a "a discussão do vazio" foi o que mais marcou a última bienal. O que você gostaria que marcasse sua Bienal?

Dos Anjos - O fato de ser uma exposição que levou a arte a sério. O que não se confunde, em absoluto, com querer uma mostra sisuda. Levar a arte a sério é apostar na sua capacidade de mover as pessoas ao ponto delas, no limite, mudarem os parâmetros com que se relacionam com seu entorno.

Que exposição já provocou isso em você?

Dos Anjos - Lembro-me, por exemplo, da visita que fiz a uma exposição do Anselm Kiefer, no MAM de São Paulo, em 1998. Embora seja um artista que hoje não admiro tanto quanto já admirei, aquele foi um desses momentos em que a arte provou, para mim, do que é capaz. Não há texto ou elaboração discursiva quaisquer capazes de proporcionar o que senti naquela mostra, onde a dor da guerra era abordada de modo direto sem ser meramente ilustrativa, e era, talvez até por isso, transformada em uma questão que importa a todos.

De certa forma, a arte mudou mesmo sua vida, afinal você era economista...

Dos Anjos - Sim, esse é um "statement" curatorial absolutamente sincero, porque é a minha própria história.

Um dos riscos que se pode cair ao se preocupar com "sensibilizar" é cair no espetáculo, não?

Dos Anjos - É evidente que existe um desafio em se fazer uma mostra cativante que, ao mesmo tempo, não apele ao consumo fácil de uma imagem, de uma ideia ou de uma forma. Costumo dizer que a Bienal tem o seu tempo próprio, que não é o do museu nem o da feira de arte. E o desafio é justamente trabalhar nesse intervalo, pois é aí que se pode afirmar a arte como algo sensoriamente envolvente e que tem, por isso mesmo, e não apesar disso, um papel relevante para desempenhar no mundo.

De que maneira isso será possível na 29ª Bienal?

Dos Anjos - Não há fórmulas, sendo necessário lançar mão de um conjunto de estratégias articuladas. E uma das principais diz respeito à forma de apresentação dos trabalhos no espaço. Queremos criar um ritmo expositivo envolvente e ritmado, que rompa a monotonia tão comum em grandes mostras e que faça o visitante se aproximar dos trabalhos. Crucial para isso será a criação de praças no meio da mostra, locais que servirão para descanso, reflexão e também para apresentação de performances ou palestras sobre as obras que estarão naquela vizinhança, permitindo uma relação diferenciada e diversificada com a arte ao longo do percurso.

No projeto da mostra, você sugere que a Bienal apresente 150 artistas. Quantos desses, você gostaria que fossem brasileiros? Por que a Bienal de São Paulo precisa ser uma vitrine para a arte brasileira se a Documenta de Kassel não faz essa pressão pela arte alemã?

Dos Anjos - Não há um número preestabelecido de artistas brasileiros na Bienal, embora a insipiência e a fragilidade dos mecanismos institucionais para absorção e circulação da produção artística existentes no Brasil --principalmente se comparados com os de um país como a Alemanha-- até possam justificar uma presença relativamente forte de artistas brasileiros na mostra. Desde, é evidente, que isto não signifique uma posição paternalista ou implique um rebaixamento dos padrões adotados para o conjunto da mostra. Mas o fato é que a história da Bienal de São Paulo é a de uma instituição cuja missão é a de se abrir ao mundo, ao diferente, e esta edição buscará honrar esse compromisso.

Como você define a "natureza irredutível da arte" explicitada no projeto?

Dos Anjos - Como aquilo que faz da arte uma fonte de conhecimento do mundo que não pode ser encontrado em outras esferas: Nem na ciência, nem na religião, nem no âmbito mais controlado da cultura. A arte é aquilo que sempre escapa às tentativas de redução a outros campos, sendo, em alguma medida, intraduzível. Paradoxalmente, é justamente por isso que ela importa tanto.

Independente dos nomes que estejam sendo cogitados e convidados para a Bienal, quais os artistas que, parafraseando o Mario Pedrosa citado em seu projeto, exerçam a experiência da liberdade?

Dos Anjos - São muitos, e não convém, evidentemente, citar muitos nomes a esta altura do desenvolvimento do projeto. Mas, menciono como exemplos de artistas visuais consagrados que ainda assim fazem da arte um "exercício experimental da liberdade", Artur Barrio e Jimmie Durham. Ou como fazem, no âmbito da música popular, Tom Zé ou Radiohead. Ou, no cinema, Chantal Akerman, Abbas Kiarostami ou Pedro Costa. Ou Jérôme Bel na dança.

Folha - A Bienal pretende reavaliar a história da arte brasileira após os anos 1960 e 1970. O que isso significa? Os anos 1980 não seriam os anos da pintura, como virou bordão?

Dos Anjos - O que se pretende é tão-somente sugerir, através da seleção de obras de artistas brasileiros que permearão toda a mostra, que essa visão de que tivemos uma arte política nos anos 1960 e 1970 e, a partir dos anos 1980, uma arte descompromissada com a realidade é equivocada. Arte política é aquela capaz de mudar o modo como experimentamos o mundo, não importando apenas se ela tematiza ou não conflitos, e muito menos qual o meio expressivo de que faz uso --pintura, texto, vídeo, instalação ou gravura.

Folha - Você pode dar alguns exemplos?

Dos Anjos - Há um trabalho, feito ainda nos anos 1930, que acho que pode ser tomado como um paradigma, na arte brasileira, da possibilidade de se pensar a relação entre arte e política de uma maneira mais ampla e relevante. É a Experiência Nº 2 de Flávio de Carvalho, aquela ação, ou proto-performance, em que ele caminha, de chapéu na cabeça, no sentido contrário da massa de fiéis que acompanha uma procissão, causando revolta e quase seu linchamento. Saltando direta e propositadamente para os anos 1980, poderia citar, entre vários outros exemplos possíveis, Rosângela Rennó ou Nuno Ramos, artistas que iniciam suas carreiras naquela década e cujas obras têm, assim como a Experiência Nº 2 de Flávio de Carvalho, essa capacidade de, mesmo quando não tematizam a política, nos fazer olhar o que está à nossa volta de um modo diferente; e se a arte faz isso, é evidente que ela faz política.

Folha - Nos anos 60 e 70, artistas e a arte tiverem uma resposta bastante clara ao contexto da época, criticando a ditadura e propondo novas formas de relação com a arte. O que a arte tem de importante para o contexto atual?

Dos Anjos - O mundo atual é marcado por um sem número de conflitos que nos atravessam a toda hora em intensidades e de maneiras distintas. E são muitos os artistas que, de diferentes maneiras, respondem a essa situação complexa, seja tentando compreendê-la ou intervindo nela diretamente. Respostas que são tanto mais relevantes quando vão além da ilustração desses conflitos ou da afirmação de princípios humanistas, por mais meritórios que estes sejam. O que torna a arte importante no contexto atual é justamente seu poder de abrir fissuras, através de seus próprios meios e valendo-se de uma língua que é só sua, nas convenções que ancoram nosso entendimento da realidade.

Fotógrafa Loretta Lux conta como a pintura influencia seus retratos

Mario Gioia da Folha de S.Paulo

Uma romântica em tempos digitais. Assim pode ser definida a artista alemã Loretta Lux, um dos principais nomes da fotografia em âmbito mundial e que é a principal estrela do Paraty em Foco.

Autorretrato da alemã Loretta Lux; fotógrafa é um dos destaques do Paraty em Foco

Espécie de "Flip da fotografia", o evento começa no dia 23 e se baseia em palestras e workshops de nomes de destaque da área. Neste ano, além de Lux, podem ser destacadas a presença da argentina Alessandra Sanguinetti e de coletivos de vários países, como o paulistano Garapa (mais informações podem ser encontradas no site www.paratyemfoco.com).

Em entrevista à Folha, Lux se aproxima mais da pintura para explicar a sua obra, incensada no circuito de artes internacional --ela ganhou em 2005 o Infinity Award for Art, um dos prêmios mais importantes na área, e suas imagens estão em museus como o Guggenheim, em Nova York, e o Reina Sofía, em Madri.

"Vejo-me como pintora que usa a câmera como ferramenta. Penso como pintora quando estruturo minhas composições, organizando formas e cores ao encenar a fotografia e trabalhar na tela do computador", conta ela.

"Meu processo de trabalho é muito mais próximo da pintura do que da fotografia, já que é bastante demorado e eu às vezes produzo apenas de três a cinco imagens por ano."

Os retratos hiperrealistas de crianças, marca principal de seus trabalhos, se relacionam ao ideário romântico que Lux carrega desde a sua formação. "Defino-os como retratos imaginários, porque não são de fato sobre as crianças que fotografei. Para mim, uma obra de arte precisa transcender o seu tema. As crianças em minhas imagens servem como metáfora para a inocência e o paraíso perdido da infância", diz ela.

Mas anuncia uma mudança de foco. "Minha série sobre crianças acabou. Logo começarei a explorar outros temas."

Lux nasceu em Dresden, na antiga Alemanha Oriental, e se graduou em artes em Munique. Desde pequena, era fascinada pelos mestres da pintura.

"Meu avô costumava emoldurar reproduções de retratos históricos de crianças para me dar como presente de aniversário. Lembro de ter em meu quarto reproduções da "Infanta Maria" e do "Príncipe Baltasar", de Velázquez, bem como outras imagens de infantes por Bronzino, Reynold, Gainsbourough e Goya."

Quando estudava artes, foi decisivamente influenciada por pintores do romantismo alemão, como Caspar David Friedrich e Philipp Runge.

"Tenho grande interesse pelos românticos. Eles se sentiam desiludidos diante da sociedade materialista e do início da industrialização. Rejeitavam o iluminismo e em lugar dele enfatizavam a intuição e o sentimento, exaltando a natureza."

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Ministro da Cultura lança projeto na Bienal

fonte: O Estado de S. Paulo

O ministro da Cultura, Juca Ferreira, esteve ontem à noite na Fundação Bienal de São Paulo para apresentar o Programa Brasil Arte Contemporânea, do qual a entidade, a Bienal do Mercosul de Porto Alegre e Funarte serão destaques como integrantes de seu comitê. Ferreira aproveitou para expressar o apoio do governo federal à nova diretoria executiva da instituição, presidida por Heitor Martins. "A Bienal de São Paulo é o grande evento globalizado da arte no Brasil", afirmou.

Depois do anúncio, Ferreira participou do jantar que a instituição realizou, no Ibirapuera, para arrecadar fundos. O Programa Brasil Arte Contemporânea foi publicado anteontem no Diário Oficial da União e já conta neste ano com orçamento de R$ 1,2 milhão. É destinado ao fortalecimento das artes plásticas e visuais brasileiras no mercado internacional e visa estimular as exportações setoriais e a divulgação das obras de artes nacionais.

"As dificuldades que a nova diretoria passou com o Ministério Público (do Estado de São Paulo) são fruto da herança da administração passada (de Manoel Pires da Costa). Ajudamos a produzir confiança no MP para a realização desse evento estratégico. Vamos apoiar diretamente a restauração do prédio da Bienal", afirmou o ministro.

A reforma do pavilhão começará neste ano. Segundo o Ministério da Cultura (MinC), já serão disponibilizados neste ano R$ 4 milhões. O aporte a partir de 2010 contará também com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Martins explicou que as primeiras providências serão tratar de colocar hidrantes e saídas de emergência. A parte mais cara (de cerca de R$ 10 milhões) será a climatização total do edifício, com 30 mil m² (apenas 10% da área é climatizada). "É uma exigência de museus de todo o mundo, essa é uma limitação que restringe nosso acesso a obras e à curadoria", afirmou Martins. Segundo ele, a 29ª Bienal será inaugurada em 21 de setembro de 2010. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

7ª Bienal anuncia artistas escolhidos para a mostra Projetáveis


Concurso internacional mobilizou mais de 800 artistas em 45 países

A 7ª Bienal do Mercosul anuncia os artistas selecionados para participar da mostra Projetáveis, uma das sete exposições desta edição, que acontece em Porto Alegre/Brasil, de 16 de outubro a 29 de novembro deste ano. A exposição, que será apresentada no Santander Cultural, vai mostrar 19 obras de 25 artistas, que estarão também na web através do site www.bienalmercosul.art.br. Outros 13 artistas terão seus trabalhos exibidos no site. Confira abaixo a lista completa.
Concebida pelo curador adjunto e artista argentino Roberto Jacoby, esta exposição sugere a arte como espaço para a projeção de ideias, de planificação, de comunicação, da imaginação. A curadoria convidou artistas de todo o mundo a apresentarem projetos “projetáveis” em seus vários sentidos: o projetável como o imaginado, aquilo que cria novos públicos ou aquilo que representa um território, como na cartografia. A convocatória, aberta a artistas de todo o mundo, foi realizada entre os meses de maio e agosto e recebeu cerca de 800 projetáveis. Artistas de quase 50 países, como Alemanha, Argentina, Austrália, Áustria, Brasil, Bélgica, Bósnia Herzegovina, Canadá, Chile, China, Colômbia, Costa Rica, Croácia, Cuba, Dinamarca, Emirados Árabes, Equador, Eslovênia, Espanha, Estados Federados da Micronésia, EUA, França, Grécia, Holanda, Hungria, Índia, Irã, Iraque, Irlanda, Israel, Itália, Japão, Lituânia, Malta, México, Paquistão, Porto Rico, Portugal, Reino Unido, República Tcheca, Romênia, Rússia, Sérvia, Suécia, Tailândia, Ucrânia, Uruguai e Venezuela, inscreveram seus projetos.
Para Jacoby, esse formato de exibição implicou em uma grande aposta: “foi com muita ansiedade que esperamos os projetos e, felizmente, a resposta foi numerosa e diversa”. “O critério de seleção teve que ser suficientemente amplo para incluir estratégias artísticas muito diferentes entre si: desde trabalhos mais ligados à internet, até os que somente a utilizam como veículo de distribuição. Desde vídeos até obras com luzes e sons, performances, animações, colagens feitas com desenhos digitais, filmes com alta qualidade de produção, investigações urbanas e ações de amplo alcance comunitário”, explica Jacoby, afirmando que, em todos os casos, priorizou-se a consistência entre o aspecto conceitual, a forma de realização e a proposta de exibição.

Projetáveis – artistas participantes

Exposição + site

• Alejandra Prieto e Nicolás Rupcich - Chile
• Antoni Abad - Espanha
• Cinthia Marcelle - Brasil
• Colaboratório / Renata Marquez e Wellington Cançado - Brasil
• Fabiana de Barros - Brasil/Suíça
• Fernando da Silva Pião - Brasil
• Fernando Velázquez - Uruguai
• Furallefalle / Iñaki Lopez Ordoñez e Vanessa Castro - Espanha
• Grupo CDM - Centro de Desintoxicação Midiática / Ricardo Perufo Mello, Eduardo Montagna da Silveira e Leonardo de Jesus Furtado - Brasil
• Gustavo Marrone - Argentina
• Karina Peisajovich - Argentina
• Martin Kohout - República Tcheca
• Oto Hudec - Eslováquia
• Paul Matosic - Reino Unido
• Ran Huang - China
• Sara Wolfert e Mathias Tervo - Suécia
• Shirin Sabahi - Irã
• Terence Gower - Canadá
• Tina Willgren - Suécia

Artistas selecionados para o site

• Andrei Rubina Thomaz - Brasil
• Chico Zelesnikar - Brasil
• Christian de Lutz - EUA
• Hiwa K (Munir Al Azawi) - Iraque
• Jorn Ebner - Alemanha
• José Alfredo Jiménez Ortiz - México
• Lázaro Saavedra (artista convidado) - Cuba
• Maria Linares - Colômbia
• Marina Camargo - Brasil
• Olga Mink - Holanda
• Patrick Fontana, Fave e Aelters - França

10ª BIENAL DE LYON - 2009

A 10ª Bienal de Lyon que ocorre entre 16 de Setembro e 3 de Janeiro, sob o título “O espectáculo do quotidiano”. Com curadoria de Hou Hanru, o projeto artístico desta bienal visa problematizar a sociedade do espectáculo, condição fundamental da existência contemporânea, e reafirmar, na esteira de Michel de Certeau, as possibilidades concretas de contornar a ordem estabelecida tendo por base a criatividade subjacente às práticas do quotidiano.

Cerca de 60 artistas provenientes de diferentes partes do mundo estarão reunidos em torno dos cinco projetos especiais, “A magia das coisas ou a reinvenção do quotidiano”; “Elogio da deriva”; “Um outro mundo é possível”; “Vivamos em conjunto”; e “Veduta”, que se caracterizam por uma estrutura multidimensional cujo objetivo é refletir, conceitualmente e fisicamente, o dinamismo e a complexidade do tema geral proposto.

Lista dos artistas participantes:

• Adel Abdessemed
• Bani Abidi • Maria Thereza Alves
• Fikret Atay
• Bik Van Der Pol
• Pedro Cabrita Reis
• Sophie Dejode & Bertrand Lacombe
• Jimmie Durham
• Latifa Echakhch
• Mounir Fatmi
• Dora Garcia
• Shilpa Gupta
• Ha Za Vu Zu
• HeHe
• Oliver Herring
• Tajahiro Iwasaki
• Kuswidananto A.K.A. Jompet
• Leopold Kessler
• Ian Kiaer
• Lee Mingwey
• Mark Lewis
• Michael Lin
• Lin Yilin
• Liu Qingyuan & YAH
• Barry McGee
• Robert Milin
• Carlos Motta
• Wangechi Mutu
• Eko Nugroho
• Adrain Paci
• Dan Perjovschi
• Société Réaliste
• Olivier Ressler
• Pedro Reyes
• Rigo 23
• Sarkis
• Katerina Seda
• Sarah Sze
• Tsang Kinwah
• Un Nous
• Eulália Valldoserra
• Agnès Varda
• Wong Hoy Cheong
• Huang Yongping
• Xijing Men
• Yang Jiechang
• Yangjiang Group
• L’École du Magasin