sexta-feira, 26 de junho de 2009

Entrevista: Jorge Macchi


Convivências

No mês de março, o argentino Jorge Macchi aceitou o desafio de trabalhar com a técnica que não utilizava desde seus dias de estudante de artes: veio à Porto Alegre para participar do Programa Artista Convidado do Ateliê de Gravura da Fundação Iberê Camargo. Com o auxílio do coordenador do espaço, Eduardo Haesbaert, Macchi trabalhou durante uma semana para desenvolver a obra Monstruo, criada a partir de uma página de jornal.

Depois de encher o auditório da Fundação de interessados em saber mais sobre sua trajetória, em conversa aberta ao público, Macchi falou à equipe do site sobre seu processo criativo e os desdobramentos de sua participação na 6ª Bienal do Mercosul.

Em novembro de 2006, você deu uma entrevista para o site da Fundação Iberê Camargo, antecedendo sua exposição monográfica na 6ª Bienal do Mercosul. Desde lá, o que mudou no seu trabalho?
A exposição que fiz aqui em Porto Alegre e as mostras posteriores a ela – no Blanton Museum e na Galícia – foram a primeira oportunidade que tive de ver juntos, em um mesmo lugar, 20 anos de trabalho. Esta é, realmente, uma experiência muito forte. Ver todas as obras juntas me fez pensar em muitos aspectos do trabalho, me fez sentir que deveria deixar de fazer algumas coisas e deu início a um processo de muita reflexão sobre o que estava fazendo. Eu vinha trabalhando em um ritmo muito forte e, a partir deste momento, comecei a trabalhar de maneira mais lenta, tratando de não me apressar a tomar decisões.

E que caminhos surgiram a partir deste período de reflexão?
É difícil dizer agora, passou-se muito pouco tempo, é tudo ainda muito recente. Mas, digamos, a conseqüência desta mostra foi que decidi não fazer coisas “porque sim”, ou seja, resolvi que iria fazer só o que realmente tivesse sentido para mim. Depois de uma exposição tão forte como esta, me pareceu bom parar para refletir. Agora, as conseqüências ainda não sei. Quem sabe deixo de fazer isto. Não, não, brincadeira.

Na conversa com o público, no auditório da Fundação, você afirmou que desenhar é como fazer uma ginástica cotidiana, que mantém a imaginação em movimento. No entanto, você também tem trabalhado muito com instalações, sobretudo nos últimos anos. Qual é a relação entre desenhar e depois “materializar” as imagens?
O desenho é a primeira atividade que faço quando chego em casa. Pego uma folha e começo a desenhar. Para mim, isto é como “baixar” as imagens a um objeto concreto, o papel – e esta é, e sempre foi, minha primeira aproximação. No entanto, este desenho pode ser simplesmente um desenho e permanecer neste formato, ou pode dar origem a outras coisas. Mas estas outras coisas, como instalações ou vídeos, talvez não tenham em seu formato uma referência direta à imagem desenhada – podem só seguir um “clima” similar. Por isso, digo que não é o desenho que evolui até se tornar uma instalação, mas que há algo no mecanismo de criar esta imagem, ou no mecanismo de imaginar, que tem a ver com a posterior evolução até outras linguagens.

Suas instalações são, normalmente, grandiosas ou têm um certo grau de complexidade, enquanto seus desenhos, de pequena escala, e seus trabalhos com jornais, por exemplo, lidam com a simplicidade e a delicadeza. Qual é a sua medida? Como você decide por fazer um ou outro?
Há uma diferença muito grande entre os trabalhos em que eu intervenho pessoalmente – que são os obsessivos e minuciosos, de cortar papéis – e os trabalhos nos quais eu não intervenho, como, por exemplo, uma instalação de vídeos, em que há um editor para quem digo “quero isto, isto e isto” e ele o faz. Esta diferença creio que tem a ver com a minha relação com o objeto. Se estou trabalhando por horas e horas em um objeto, crio uma maior relação com ele. Por isso, talvez, os trabalhos nos quais não há tanta intervenção minha podem parecer mais frios. Ou seja, há uma diferença grande de produção, mas não sei se há outras diferenças.

O que acontece é que há obras ou imagens que pedem este trabalho manual; há outras que não o pedem. Em geral, não tenho planos de trabalho. Então, quando aparece uma imagem na qual sinto que tenho que trabalhar muito intensamente, com as minhas mãos, faço isto. E se aparece outra imagem em que dependo de outra pessoa, vou atrás e faço também. Ou seja, não tenho um plano. Não é que determinado tipo de trabalho corresponde a uma determinada época, nem nada assim. São duas atividades que convivem – como convivem também com os desenhos. Eles são manuais e feitos por mim, mas são imediatos, o que gera outra atitude: fazer um desenho a uma velocidade muito rápida é bem diferente de recortar papéis durante horas e horas, como também é distinto de encarregar um trabalho a alguém. Só que, ao mesmo tempo, estas são três coisas que convivem em mim, e eu trato de não deixar de lado nenhuma delas.

Você trabalha muito com mapas, e também já viajou a muitos lugares fazendo residências, levando exposições. Que cartografia você faria de sua própria trajetória?
Houve uma época em que eu estava obcecado por viajar. Vivia em Buenos Aires, mas tinha a certeza de que meu lugar não estava lá. Não sabia onde estava, mas sabia que era em outra parte. Então, comecei a fazer o possível para viajar: consegui bolsas, fiz uma residência em Paris, viajei com exposições e depois vieram as residências na Holanda, na Inglaterra e na Alemanha. Quando terminou este período, que foi muito intenso, decidi voltar a Buenos Aires e tomar a cidade como uma base para, a partir de lá, sair – mas sempre com a intenção de voltar. Isto porque, se penso na cidade, penso que é o lugar onde estão meus afetos, minha família, meus amigos. E o que me dei conta, naquele momento, foi que escolher um lugar para viver é como escolher um marido ou esposa: não aparece maravilhosamente do nada, para ficar junto durante anos, com tudo fantástico. É preciso fazer algo para que o casal sobreviva. E assim me dei conta de que devia fazer algo para que Buenos Aires fosse um lugar agradável para eu viver. Quando compreendi isso, passei a me sentir muito bem lá. Claro que a cidade é, como disse antes, uma base para que eu possa viajar para todos os lados – e agora talvez viaje até mais do que antes –, mas tenho a certeza de que tenho um lugar para voltar. Isto é muito tranqüilizador. Então, a minha cartografia seria algo assim: no centro está Buenos Aires, e até mais ou menos o ano de 1998, eu estava indo para todos os lados, tratando de buscar algo. Agora, de Buenos Aires saem caminhos de ida-e-volta.

Como foi trabalhar no Ateliê de Gravura da Fundação Iberê Camargo depois ter ficado muitos anos sem contato com a técnica?
Na realidade, eu nunca fiz gravuras. Aprendi a técnica na escola, mas isto não quer dizer que já a tenha usado para alguma coisa. No entanto, a gravura até poderia conviver com os trabalhos que faço, o que acontece é que não conheço bem a técnica, e por isso não me ocorrem coisas que poderiam ser feitas com ela. Então, tomo esta residência aqui na Fundação mais do que como um convite para produzir uma obra: vim para aprender.

E como surgiu a proposta de trabalhar com o jornal também nesta gravura?
A imagem da gravura é, de certa forma, uma evolução do que se viu na exposição de dois anos atrás. Ela é o resultado de uma subtração: a página de um jornal da qual foi tirado o elemento textual. O que fica é uma estrutura abstrata, mas não pura, porque aparecem elementos visuais que fazem com que se possa relacionar a imagem com o material original, o jornal. Isto é algo que sempre me interessou: a estrutura geométrica e simples, mas que tem, por trás da simplicidade, uma carga deixada pelo material – ainda que, no momento de fazer um trabalho como este, o material propriamente dito se perca. Aliás, este é um problema conceitual que tenho com a gravura, porque nela se passa do uso de um material à representação deste material. Mas, de qualquer forma, acredito que o que conta mais é o diálogo entre a estrutura abstrata e de onde se entende que o material saiu.

Santa Maria recebe artista em programa de residência da 7ª Bienal do Mercosul


O Projeto Pedagógico da 7ª Bienal do Mercosul dá início às atividades desta edição com o programa de residências “Artistas em Disponibilidade”, que vai levar 12 projetos de 14 artistas a diversas regiões do Rio Grande do Sul para trabalharem seus métodos de arte-educação com as comunidades locais.
A partir desta quinta-feira, 25 de junho até o dia 29, segunda-feira, a artista argentina Claudia Del Río vai estar em Santa Maria para visitar escolas, universidades, conhecer professores e outros grupos que possam contribuir para a aplicação de seu projeto na cidade. Após este período de pesquisa e aproximação com a comunidade, a artista vai retornar à cidade no início de setembro para o período de residência, que terá duração de, aproximadamente, 25 dias.
A artista vem propor à comunidade de Santa Maria seu projeto Club Del Dibujo (Clube do Desenho), com o intuito de despertar o interesse e iniciar pessoas na prática do desenho e do clubismo. O projeto configura-se como um espaço dedicado ao estudo, cuidado e promoção do desenho, que reúne artistas profissionais e amadores, além do público em geral. http://clubdeldibujo.wordpress.com/club-del-dibujo/

Claudia Del Río
Claudia del Río nasceu em Rosário, na Argentina. Estudou teatro, pintura e licenciou-se em Artes Visuais na Escuela de Bellas Artes de la U.N.R., onde é professora desde 1982. Nos anos 80 trabalhou em circuitos chamados alternativos, em mail-art, performances e edições. Entre 1994 e 1995 foi selecionada para o programa Clinica de Obra, organizado pela Fundação Proa, Buenos Aires. Em 2000, foi convidada pelo Proyecto Trama (Rede de Iniciativas Artísticas) para coordenar uma experiência com bolsistas em Rosário. Desde 2001 participa como artista convidada do programa de Encontros Regionais de Produção e Análise para Artistas Visuais, organizado pela Fundación Antorchas. É co-fundadora do Club Del Dibujo. Em junho de 2004 participou como artista residente em Artekelu (San Sebastián, Espanha). Vive e trabalha na cidade de Rosário.

Sobre o Club Del Dibujo
O Club Del Dibujo foi criado em 2002 por artistas comprometidos em difundir a prática do desenho para funcionar como uma plataforma de comunicação entre desenhistas e apoiar investigações históricas e sociológicas que tenham o desenho como centro. Está configurado em formato de clube porque os clubes são formas genuínas de associação, cooperação e amizade. O Club Del Dibujo propõe a ideia do desenho como ferramenta de pensamento, prazer, comunicação, memória e auto-conhecimento. O projeto compreende eventos, coleção e treinamento. Entre os eventos, o Club Del Dibujo promove encontros entre artistas e amadores para desenharem juntos, em intercâmbio aberto. Além disso, o clube promove exposições analógicas e digitais do acervo da coleção. Um dos momentos-chave é o intercâmbio de desenhos entre os desenhistas. A coleção do Club Del Dibujo está formada por cerca de 800 peças de 300 autores, todas doadas ou intercambiadas. Os programas de treinamento são dirigidos a comunidades específicas, concebidos segundo as características da população a quem estão dirigidos. Os treinamentos podem ser realizados em clubes sociais e desportivos, escolas, empresas museus, casas de família e outras instituições.

Porto Alegre recebe artista em programa de residência da 7ª Bienal do Mercosul


fonte: Bienal do Mercosul

O Projeto Pedagógico da 7ª Bienal do Mercosul dá início às atividades desta edição com o programa de residências “Artistas em Disponibilidade”, que vai levar 12 projetos de 14 artistas a diversas regiões do Rio Grande do Sul para trabalharem suas metodologias com as comunidades locais.

A partir desta quinta-feira, 25 de junho até o dia 30, terça-feira, a artista argentina Diana Aisenberg vai estar em Porto Alegre para visitar escolas, conhecer professores e outros grupos que possam contribuir para a aplicação de seu projeto na cidade. Após este período de pesquisa e aproximação com a comunidade, a artista vai retornar à cidade no final do mês de setembro para o período de residência, que terá duração de, aproximadamente, 25 dias.

A artista quer aplicar em escolas de Porto Alegre uma versão de seu projeto Histórias da Arte, dicionário de certezas e intuições. Para tanto, está propondo criar um dicionário para crianças, com imagens, palavras, textos, desenhos e pinturas. O dicionário de definições coletivas será produzido em colaboração com os alunos, através de oficinas em sala de aula e o envio por email de definições para palavras propostas por Diana. As respostas são editadas, dando voz e visibilidade a um grupo social dinâmico e aberto de participantes-autores. Para a artista, o projeto é “um convite massivo à escrita, como uma união entre a realidade e a inteligência. O Dicionário se torna sensor e receptor do que ‘está no ar’ – verdades, intuições e superstições, daquilo que entendemos como história da arte, numa linha que vai do pessoal ao público”, explica Diana.

“Historias del Arte. Diccionario de Certezas e Intuiciones” é um projeto de construção coletiva premiado pelo Proyecto Trama (Rede de Iniciativas Artísticas), de Buenos Aires, para a pesquisa da prática artística e sua projeção social. Foi editado em formato de livro pela editora Adriana Hidalgo. A versão em vídeo, intitulada, mi amigo José, recebeu o primeiro premio no VII Festival Internacional de Cine por los Derechos Humanos, na Categoria Curta-metragem documentário, em Buenos Aires. O vídeo também foi exibido no Simpósio Internacional URBANNERUNGSKUKTUREN, Berlin/Buenos Aires e no 21º Festival Internacional de Cine de Mar del Plata. Para mais informações sobre o projeto, acesse http://historiasdelartedicc.blogspot.com/

Diana Aisenberg
Vive e trabalha em Buenos Aires/Argentina. Sua obra nasce no desenho e na pintura e se expande para os projetos pedagógicos e seu dicionário de arte. Dedica-se à formação de artistas desde 1982. Ganhou destaque na Associação de Críticos Argentinos por sua atuação docente no ano de 2000 e recebeu o prêmio “J.A Martínez” em 2003 pela mesma associação. Foi coordenadora de artes visuais, cursos e eventos especiais do Centro Cultural Ricardo Rojas da UBA – Universidade de Buenos Aires. Coordenou a rede nacional de cursos de artes plásticas e clínicas de artistas para análise de obra (leituras de portfólio) na Argentina. Foi professora de Morfologia da Facultad de Diseño Gráfico da UBA e Fundación Antorchas, entre outros. Foi curadora do espaço jovem ArteBA em 2006. Desde 2006, organiza a Residência de Artistas RIAA. Entre as mostras individuais mais importantes estão: Escuela/Salta, MAC Salta, 2009; Escuela, CCR, sala cronopios, 2008; Arquitectura del Cielo, Galeria Daniel Abate, 2006; Maestro, Fundacion Arteviva, Project room, feira arteBA. 2005; CCBorges, proyecto sala2, Combo, 2003; arteBA, project room, buen gusto. 2002; Sobremesa, Espacio VOX, Bahía Blanca, 2001; Capricho Solar, Teatro Auditórium, Mar del Plata, 2000; Jardín, La Casona de los Olivera,1999; Centro Villa Victoria Ocampo, Mar del Plata, 1998; La Pequeña Galería, Asunción, Paraguay, 1994; C.C.R. Rojas, Universidad de Buenos Aires, 1992. Entre as mostras coletivas que participou, destacam-se: Alianza Francesa, Buenos Aires, Vé, Vete Y Vuelve, 2008; Centro Cultural España Cordoba, 150 mts Poéticos, 2007 e Boquitas Pintadas, Shangrilla, 2007. www.daisenberg.spaces.live.com

Programa de Residências – Artistas em Disponibilidade
O Projeto Pedagógico da 7ª Bienal do Mercosul convidou 14 artistas que vão aplicar suas próprias metodologias educativas em comunidades de diferentes regiões do estado do Rio Grande do Sul. O objetivo final é inserir esses projetos artísticos dentro do sistema educativo e incentivar a interdisciplinaridade como lugar de encontro entre práticas artísticas e não-artísticas, entre a arte e o real.

De agosto a outubro, serão realizadas três residências em Porto Alegre e na Grande Porto Alegre. As outras residências serão realizadas no mesmo período, nas seguintes cidades do Rio Grande do Sul: São Leopoldo, Montenegro, Pelotas, Caxias do Sul, Santa Maria, Santana do Livramento, Santa Vitoria do Palmar e cidades do litoral norte como Maquiné, Osório e Torres.

Participam das residências quatro artistas brasileiros (João Mode - Projeto REDE; Júlio Lira - Percursos Urbanos e mediação de saberes; Ricardo Basbaum – NPB, Novas Bases para a Personalidade; Maria Helena Bernardes e Andre Severo - Arte da conversação); quatro artistas da Argentina (Diana Aisenberg - História(s) da arte - Dicionário de Certezas e Intuições / Historia(s) del art Diccionario de Certezas e Intuiciones;, Claudia del Río – Clube do desenho/Club del dibujo; Diego Melero – Aulas de Ginástica e Filosofia política/Clases de Gimnasia e Filosofía política; Rosario Bléfari – A realidade em partituras, laboratório de escritura e canções/La realidad en partituras, laboratorio de escritura y canciones), um artista da Colômbia (Nicolás Paris - Laboratório de desenho/Laboratorio de dibujo), um curador do Chile (Gonzalo Pedraza – Coleção Vicinal/Colección Vecinal); um coletivo de artistas do Uruguai (Francisco Tomsich y Martín Verges – Transposição de um estudo para um retrato comum / Traspuesto de un Estudio para un Retrato Común) e um artista francês (Nicolás Floc`h - A grande troca, projeto para desejos coletivos).

João Loureiro instala baleia na Pinacoteca

Silas Marti da Folha de S. Paulo

Depois dos animais de espuma que fez para a Vermelho, artista cria bicho em escala real para expor no octógono

Baleia coberta de jeans azul mede 18 metros; individual de Loureiro com rato, raposa, rinoceronte e elefante de espuma continua em cartaz

"Blue Jeans", baleia de isopor revestida de jans azul do artista João Loureiro, na Pinacoteca

A baleia de João Loureiro veste jeans azul. Em escala real, é uma tonelada de isopor no formato do bicho, com 18 metros de ponta a ponta, revestida com 220 metros do tecido mais popular da moda. Está encalhada agora no octógono da Pinacoteca do Estado, com o rabo espichando para outra sala. "É mais o jeans do que a baleia, mas a baleia não é um veículo neutro", diz Loureiro, 36. "Há uma proximidade com a espetacularização da arte contemporânea, uma monumentalidade introjetada na obra."
Ele conta que teve a ideia para o trabalho quando viu uma bobina gigante de jeans numa fábrica de tecido e se impressionou com aquilo fora de escala. Daí escolheu a baleia como forma para mostrar a potência do jeans na cultura popular. De quebra, serviu para aproximar a arte contemporânea a algo massificado, de consumo fácil. Também parece fácil a proposta da obra, quase uma receita de bolo instantâneo para esse tipo de arte fast food que Loureiro tenta questionar.
Na individual que montou na galeria Vermelho, em cartaz até semana que vem, ele expõe cinco bichos de espuma cinza: raposa, burro, rato, rinoceronte e elefante, numa espécie de esboço para a baleia atual. Tanto ali quanto na Pinacoteca, Loureiro quer "problematizar o contexto". "É muito mais a relação tortuosa que eu acabei estabelecendo com a instituição", diz. "A baleia ocupa duas salas, explode a simetria que existia nesse espaço, espirra para outro lado."

Espécime embalsamado

Mas a força dessa baleia, e do elefante, rinoceronte e companhia, existe só em segunda leitura. Não está nesse desafio ao espaço, e sim no ponto em que se sustenta e se legitima a partir dele. Num contexto de museu, a baleia encalhada, quase como espécime embalsamado de um museu de história natural, ganha ares de peça rara, que merece certa reverência e a iluminação dramática da galeria. "Pensei em como fazer uma forma viva aparecer com essa secura", diz Loureiro.
Noutra tentativa de questionar o espaço expositivo, Loureiro já fotografou pessoas fantasiadas de fantasmas no setor administrativo do Centro Cultural São Paulo e acabou tendo a obra retirada por causa de reclamações de funcionários. Sua fauna atual mostra certa evolução em relação àquela primeira tentativa de contestação, mas fica a impressão que o tamanho dos bichos esconde um tanto a falta do que dizer. Talvez mais do que uma baleia de blue jeans, Loureiro pode ter criado aqui um elefante branco.

JOÃO LOUREIRO

Quando: ter. a dom., das 10h às 18h
Onde: Pinacoteca do Estado (pça. da Luz, 2, tel. 3324-1000)
Quanto: R$ 4; grátis hoje

Arte sem limites

Camila Molina do Estadão

A artista Lenora de Barros anda agora com nova "mania": pelos lugares em que passa, pega seu celular, ou um gravador, e começa a captar qualquer tipo de som. Em visita há pouco à atual Bienal de Veneza, quando tirou seu celular da bolsa para gravar os ruídos da exposição de Bruce Nauman, a monitora da sala quis lhe chamar a atenção, pensando que Lenora tiraria uma foto, sem permissão, da obra do americano. Mas a brasileira explicou que queria apenas captar o som do local e a segurança ficou, na verdade, sem jeito - deu um nó em sua cabeça: era proibido ou não fazer aquilo? Resolveu deixar.

Lenora ri e acha curiosa essa passagem que faz parte de sua missão de "desvendar o verbivocu", como ela diz, brincando com a expressão dos concretistas, "verbivocuvisual" - poesia (concreta) e visualidade sempre foram temas chaves da criação da artista, filha de Geraldo de Barros - ou, falando de uma maneira mais simples, de sua pesquisa sobre sonoridades. É que desde o ano passado Lenora virou "radialista": está desenvolvendo o projeto da Radiovisual, uma das atrações da 7ª Bienal do Mercosul, a ser inaugurada para o público em outubro em Porto Alegre (ler ao lado). "Depois da fotografia e do vídeo confesso que ainda não sei traduzir como é a sensação de ter a memória de um lugar pelo som e não pela imagem", diz Lenora.

Como criar uma programação de rádio para um evento de arte? A ideia, na verdade, partiu do escultor Artur Lescher, um dos curadores da Bienal do Mercosul. "O espaço sonoro magnético atravessa a cidade. Fiquei com essa imagem na cabeça como uma possível metáfora para a seção que vai tratar dos espaços públicos", afirma Lescher. "Rádio é mídia econômica, inclusiva, com capacidade grande de absorver conteúdos, mais do que uma exposição com paredes", diz o escultor.

No ano passado, ele convidou Lenora para fazer a curadoria da Radiovisual e executá-la. O projeto está em seus últimos acertos. Seu conceito envolve a transmissão de um programa "informativo e experimental", diário e com uma hora de duração, provavelmente, no dial "físico" da rádio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul quanto na esfera virtual, pela internet, para ser compartilhada para além das fronteiras. A Radiovisual tem até slogan: "A rádio que excita a frequência." A mídia estimula a imaginação.

Não é de hoje que artistas trabalham no campo da sonoridade, muitos até mesmo fazendo obras para o rádio. No Brasil, recentemente, pode-se citar o Oidaradio, com curadoria de Nick Graham-Smith e Kiki Mazzucchelli e apresentado no ano passado no Paço das Artes, ou mesmo Dora Longo Bahia, que tinha como parte de sua obra para a 28ª Bienal de São Paulo, em 2008, a realização do programa Rádio Macaco, infelizmente não concretizado. Entre os estrangeiros, Lenora faz menção ao americano Gregory Whitehead, que desde a década de 1980 cria para rádio. Mas o artista fundamental para o conceito da Radiovisual da Bienal do Mercosul é o compositor experimental americano John Cage e sua famosa peça 4?33 , de 1952: a composição é feita de nenhuma nota, mas da proposta de que o músico fique parado durante esse período. "Ele é o nosso mentor conceitual", diz Lenora.

A Radiovisual, que também conta com a participação do jornalista Fabrizio Rosa, vai ter uma seção em homenagem a Cage, Ao Redor de 4?33, com peças sonoras criadas por artistas, poetas, escritores, músicos e até cientistas convidados. Essas obras também serão "exibidas" por meio de headphones numa arquibancada nos armazéns do Cais do Porto, às margens do Rio Guaiba.

A ideia é a de que a rádio tenha uma sede com lounge e veicule obras sonoras históricas de Cildo Meireles e Antonio Dias, por exemplo. Depois, para ficar o registro dessa ação, a Radiovisual também vai figurar no catálogo da Bienal do Mercosul. Como? Gravada em CD.