sexta-feira, 17 de abril de 2009

Em crise, Bienal é adiada para 2011

Instituição procura novo presidente

por Catia Seabra da Folha de S. Paulo


Enfrentando severa crise, o conselho de administração da Bienal de São Paulo já trabalha com adiamento de um ano da mostra de arte. Pelo calendário apresentado ao secretário municipal Andrea Matarazzo(recém-convidado a assumir a presidência da fundação), a próxima Bienal está programada para 2011. Não mais para o ano que vem, como originalmente previsto. Além disso, planejada para este ano, a Bienal de Arquitetura só deverá acontecer a partir de 2010.
Até lá, o futuro presidente ganharia fôlego para sanear as contas da fundação, negativas, pelo menos, há dois anos.
O prédio onde ocorre a Bienal de São Paulo e a Bienal de Arquitetura, projetado por Oscar Niemeyer e que fica no parque Ibirapuera

Segundo números obtidos pela Folha, a Fundação Bienal de São Paulo encerrou 2008 com uma dívida de curto prazo de R$ 4,657 milhões, sendo R$ 2,39 milhões com fornecedores e R$ 859 mil em empréstimos.
Ainda de acordo com o documento(encaminhado ao conselho fiscal e chamado de "minuta" pela presidência da Bienal) a fundação gasta, ao longo do ano, mais do que arrecada.
Em 2008, sua receita foi de R$ 13,9 milhões, e as despesas, R$ 15,6 milhões: um buraco de R$ 1,643 milhão. Em 2007, o déficit foi de R$ 1,551 milhão.

Procura-se
Desde outubro, o conselho da Bienal procura um sucessor para o atual presidente da fundação, Manoel Pires da Costa. Pelo estatuto, seu mandato estaria encerrado no dia 6 de fevereiro, dois meses depois da conclusão da Bienal.
Mas a debilidade financeira está afugentando os potenciais pretendentes. Presidente do conselho administrativo da fundação, o arquiteto Miguel Pereira conta que, antes de Matarazzo, outros cinco foram sondados para o cargo.
Os números da fundação, reconhece, os desencoraja. "A bienal está demorando a resgatar o prestígio e credibilidade. Sofremos um revés acentuado, principalmente nos últimos dois anos", afirma Pereira.
Também dedicado à escolha do novo presidente, o conselheiro Julio Landmann conta que a lista de convidados incluiu José Olympio, Rubens Barbosa e Suzana Steinbruch.
"Não me lembro de outra Bienal em que o novo presidente não estivesse conhecido até meados de março. Estamos no mínimo um mês atrasados", diz Landmann.
Aberta essa lacuna, o conselho está, segundo Landman, disposto a adiar a Bienal para 2011. "Eu jamais faria em 2010. Não me parece lógico. O conselho, por si só, já está convencido de que não seria ideal. Vamos dizer: não teria empecilho jogar ela para frente por mais um ano", admite Landmann.
Ao ser convidado pelo conselho, Matarazzo foi informado de que a intenção é montar a Bienal de artes somente em 2011. É a data que fixa o tamanho do mandato do novo presidente.

Consenso
"Há um consenso de que a mostra foi postergada para 2011. Estou trabalhando com esse prazo", afirma Matarazzo, à espera da revisão de uma auditoria sobre os números da Bienal. Até o presidente Manoel Pires da Costa reconhece: "Não é uma coisa absurda, em função do que está acontecendo na economia do mundo, deixar para fazer a Bienal daqui a dois, três anos".
Pires da Costa(que teve a minuta de balanço questionada pelo conselho fiscal) prefere generalizar a crise: "É um problema da economia do mundo".
Na semana passada, as contas da Bienal foram apresentadas para o conselho de administração. Contratada pela fundação, a empresa Deloitte Touche Tohmatsu apontou ressalvas nas demonstrações financeiras da fundação. A auditoria será revista.
O presidente da Bienal chegou a agendar uma entrevista com a Folha para falar sobre a saúde financeira da fundação. Mas, por orientação de seu advogado, o encontro foi cancelado. Em nota, a assessoria disse esperar o fim da auditoria.
Matarazzo, por sua vez, depende desses números para tomar sua decisão. "Nunca tinha cogitado isso. O que me sensibiliza é o risco de a Bienal terminar", acrescenta ele, que carrega o sobrenome de Ciccillo Matarazzo, fundador da instituição.


Pires da Costa tem trajetória polêmica na Fundação Bienal



por Fábio Cypriano da Folha de S.Paulo


Manoel Francisco Pires da Costa entrou para a Fundação Bienal de São Paulo no final de 2000, numa das vagas abertas após uma série de conselheiros, entre eles Milú Villela, deixarem a instituição, depois de polêmicas que culminaram com a renúncia do então curador da 25ª Bienal, Ivo Mesquita.

Auxiliando na captação de um evento já em desgaste, Pires da Costa aproximou-se do então presidente da Fundação, o arquiteto Carlos Bratke, que lançaria seu nome para sucedê-lo, com apoio de Edemar Cid Ferreira, em julho de 2002. Na época, Pires da Costa era filiado ao PPS e havia sido presidente da BM&F (Bolsa de Mercadorias e de Futuros), cargo que teve que deixar após ser acusado, em 1996, de má gestão administrativa no Banco Patente pelo Conselho do Sistema Financeiro Nacional.
Manoel Francisco Pires da Costa, atual presidente da Bienal

A primeira polêmica com Pires da Costa na Bienal ocorreu em junho de 2003, quando Ethel Leon, curadora da 5ª Bienal de Arquitetura, pediu demissão do cargo por "falta de apoio institucional e verbas", quatro meses antes da mostra.

Em março de 2005, Pires da Costa foi reeleito presidente. Após uma enxurrada de críticas à 26ª Bienal, que teve Alfons Hug como curador, o presidente abriu mão de indicar um substituto e realizou um processo seletivo, organizado por um conselho, que escolheu Lisette Lagnado para cuidar da 27ª Bienal de São Paulo, realizada em 2006.

Em abril de 2007, às vésperas da segunda reeleição, Pires Costa se autodenunciou ao Ministério Público, admitindo que contrariou o estatuto da Bienal, que proíbe que membros da instituição forneçam bens à instituição, por usar sua empresa TPT para publicar a revista "BienArt".

Naquele mesmo mês, pela primeira vez na história da Bienal, o Conselho Fiscal recusou as contas da gestão de Pires da Costa, por "julgá-las comprometidas", mas a instituição reelegeu o empresário com um "voto de confiança" e a condição de uma comissão de ex-presidentes averiguarem as contas de sua gestão, que não chegou a nenhuma conclusão.

Em maio de 2007, a Folha publicou que, além de fazer negócios com a Bienal pela TPT, Costa comprava duplicatas que a instituição tinha para receber das firmas que alugavam espaços no pavilhão de exposições. Além disso, sua mulher recebia pela jardinagem e arranjos florais da Bienal e a corretora de seu genro fez os seguros da 27ª Bienal.

O Ministério Público considerou que, apesar de irregular, o negócio de Pires da Costa com a TPT não trouxe prejuízos à Fundação, mas realizou um Termo de Ajustamento de Conduta, no qual, entre outras coisas, o empresário comprometeu-se a não contratar empresas de parentes de diretores, conselheiros da Fundação e seus parentes de até o terceiro grau.

Assim como ocorreu com a mostra do "vazio", no ano passado, que não pagou artistas e prestadores de serviço dentro dos prazos estabelecidos, problemas com pagamento também marcaram a edição de 2006, que só teve suas contas encerradas quase dois anos depois de seu término.