sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Allan McCollum: Americano desafia os originais



Allan McCollum faz individual com pastiche da reprodução em massa: vasos, formas e quadros idênticos

Artista conceitual que esteve na última Bienal de São Paulo ganha primeira mostra de peso no Brasil, aberta pela galeria Luciana Brito

Silas Martí da Folha de S. Paulo

Allan McCollum não acredita em auras atrofiadas. Não importa que as obras de arte não sejam mais únicas. Seu trabalho é feito de cópias, substitutos e originais questionáveis.
Desde que é possível produzir quase tudo em grande escala, o mercado de arte se equilibra tentando restringir circulações, edições de gravuras e impressões fotográficas, mantendo a escassez como motor da demanda e âncora dos preços.
Na contramão, McCollum, ou seu discurso, dispensa objetos únicos. "A reprodução cria outro tipo de aura, uma aura que inclui o espectador", diz o americano, que abre hoje individual na galeria Luciana Brito.


"Vejo certa magia em alguém com os mesmos sapatos que o meu, a xícara de café, a mesma coisa nas mãos de tanta gente."
Num pastiche da reprodução em massa, McCollum dispõe 50 vasos idênticos lado a lado, 70 pinturas de um retângulo negro, milhares de moldes de madeira quase iguais, 12 dos mesmos cachorros de gesso.
São cópias feitas a partir do molde de um cão original petrificado pela erupção do Vesúvio há quase dois milênios. Um museu de Nápoles replicou o bicho que morreu e fez outras três cópias, espalhadas pela Itália. McCollum usou uma delas para reproduzir sua série.

"Tem o cachorro que viveu em Pompeia, o primeiro molde do século 19, as cópias do museu e agora essa cópia e as cópias dela", lembra. "Mas estão ligadas ao cachorro original e ao sofrimento original dele."
McCollum gosta de lembrar Brecht e como o dramaturgo alemão usava artifícios para revelar que a peça era a peça, que aqueles eram atores, que a plateia era a plateia. Ele tenta fazer o mesmo em suas instalações.
"Isso é o duplo de uma galeria de arte, como num palco, no centro da ação", diz McCollum.
"Antes, fazia objetos singulares, mas não viam esses objetos como acessórios cênicos."
De certa forma, toda a obra de McCollum vira objeto cênico também, um sinal dela mesma, vista como a obra ao fundo, no cenário, dentro da teatralidade orquestrada pelo artista, como se essa fosse uma performance. Ele propõe a exposição toda como grande instalação, uma curadoria autofágica levada às últimas consequências.
Mas não é um trajeto sem escalas. Lá onde era possível programar uma máquina para executar todas as cópias, McCollum decide dar as próprias pinceladas, muda as cores e reajusta dimensões milimétricas. Tudo parece igual, mas não é.
"Estou buscando o melhor dos dois mundos", admite o artista. "Decidir se algo é original ou cópia é ambíguo, uma construção social, a ideia de que o rei é o filho de Deus e de que todos os peões são idênticos."
Suas quase cópias são vendidas a preço de original, mas sempre em série. "Cobro mais se são mais objetos e menos se são menos objetos", explica.
"Tem preços diferentes, porque algumas pessoas querem pagar mais pelos originais."

SERVIÇO

ALLAN MCCOLLUM
Quando: ter. a sex., das 10h às 19h; sáb., das 11h às 17h
Onde: Luciana Brito (r. Gomes de Carvalho, 842, tel. 3842-0634)
Quanto: entrada franca

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