Delson Uchôa e Rochelle Costi abrem individuais
De frente para o Minhocão, uma mulher estende as roupas molhadas num varal do lado de fora da janela. Rochelle Costi fixou a imagem na memória como índice da escala que fabricou para a individual que abre hoje na galeria Luciana Brito.
"É o paradoxo entre a intimidade e a cena urbana", descreve Costi, 48. "A casa é feita numa escala que nos acolhe, mas dentro da metrópole nós somos sempre pequenos. A casa dela continua sendo a casa dela."
E Costi pegou emprestada uma casa em miniatura para fotografar as nove imagens da mostra. Vista sempre à luz do sol, até parece uma casa real, não fosse a escala contestada por objetos gigantes que ocupam a sala, o sótão, a entrada.
Uma cartela de anzóis parece ganchos de açougue, cartões-postais enfileirados viram grandes telas estocadas no porão, uma caixinha de couro toma o lugar de um enorme baú.
Na fotografia que chama de síntese da mostra, Costi deita a cabeça de uma boneca solitária na sala. Causa estranhamento o olhar artificial do pedaço de plástico, agigantado, faminto. É também parte do arsenal da artista na batalha por uma delicadeza torpe, uma disjunção de espaços que deixam vazar pelas frestas suas memórias afetivas.
"Sempre trabalho muito pensando na realidade", diz Costi. "Foram intervenções no espaço que eu registrei e que foram presenciadas só por mim, a casa como contêiner de tudo."
Buscando lastro para essa realidade, ela revela que usou câmeras analógicas e deixa ver até os tubos de negativos numa das imagens. Não há intervenções digitais, como se a fotografia de agora já tivesse perdido qualquer vínculo com o real.
Talvez pelo mesmo motivo, para não perder contato com o concreto, Delson Uchôa, que também abre individual hoje na Luciana Brito, faz questão de pintar sobre o piso de seu ateliê. "Você descola o couro do chão", diz Uchôa, 53. "É o espaço sitiado da pintura, ambiente impregnado de pigmento."
Membranas de pintura
Ele despeja resina acrílica sobre o piso do ateliê e depois descasca a tela do chão, juntando à obra o barro e a sujeira das lajotas. Foi dessa forma que fez os trabalhos agora expostos no pavilhão brasileiro da Bienal de Veneza.
Na galeria paulistana, mostra o díptico "Inverno/Verão", que expôs em março na Bienal de Havana. Com motivos construtivos, são telas do tamanho da sala do artista, uma em tons terrosos, quentes e a outra com formas cristalinas e azuladas.
"São duas membranas de pintura", descreve o alagoano.
"Entre uma e outra, há um campo magnético, a ideia de estar dentro do quadro, a pintura percebida em metros cúbicos."
Na casa diminuta e na sala que vira tela estão propostas antagônicas de um mundo medido em escala doméstica. Do exercício sutil das miniaturas aos excessos coloristas, salas, quartos, portas e porões dão as coordenadas dessa arquitetura caseira a serviço da estética -a cartela opaca da cidade contraposta aos gritos dos verões e invernos luminosos do Nordeste.
ROCHELLE COSTI e DELSON UCHÔA
Quando: ter. a sex., 10h às 19h; sáb., 11h às 17h; até 31/7
Onde: Luciana Brito Galeria (r. Gomes de Carvalho, 842, tel. 3842-0634)
Quanto: entrada franca
"É o paradoxo entre a intimidade e a cena urbana", descreve Costi, 48. "A casa é feita numa escala que nos acolhe, mas dentro da metrópole nós somos sempre pequenos. A casa dela continua sendo a casa dela."
E Costi pegou emprestada uma casa em miniatura para fotografar as nove imagens da mostra. Vista sempre à luz do sol, até parece uma casa real, não fosse a escala contestada por objetos gigantes que ocupam a sala, o sótão, a entrada.
Uma cartela de anzóis parece ganchos de açougue, cartões-postais enfileirados viram grandes telas estocadas no porão, uma caixinha de couro toma o lugar de um enorme baú.
Na fotografia que chama de síntese da mostra, Costi deita a cabeça de uma boneca solitária na sala. Causa estranhamento o olhar artificial do pedaço de plástico, agigantado, faminto. É também parte do arsenal da artista na batalha por uma delicadeza torpe, uma disjunção de espaços que deixam vazar pelas frestas suas memórias afetivas.
"Sempre trabalho muito pensando na realidade", diz Costi. "Foram intervenções no espaço que eu registrei e que foram presenciadas só por mim, a casa como contêiner de tudo."
Buscando lastro para essa realidade, ela revela que usou câmeras analógicas e deixa ver até os tubos de negativos numa das imagens. Não há intervenções digitais, como se a fotografia de agora já tivesse perdido qualquer vínculo com o real.
Talvez pelo mesmo motivo, para não perder contato com o concreto, Delson Uchôa, que também abre individual hoje na Luciana Brito, faz questão de pintar sobre o piso de seu ateliê. "Você descola o couro do chão", diz Uchôa, 53. "É o espaço sitiado da pintura, ambiente impregnado de pigmento."
Membranas de pintura
Ele despeja resina acrílica sobre o piso do ateliê e depois descasca a tela do chão, juntando à obra o barro e a sujeira das lajotas. Foi dessa forma que fez os trabalhos agora expostos no pavilhão brasileiro da Bienal de Veneza.
Na galeria paulistana, mostra o díptico "Inverno/Verão", que expôs em março na Bienal de Havana. Com motivos construtivos, são telas do tamanho da sala do artista, uma em tons terrosos, quentes e a outra com formas cristalinas e azuladas.
"São duas membranas de pintura", descreve o alagoano.
"Entre uma e outra, há um campo magnético, a ideia de estar dentro do quadro, a pintura percebida em metros cúbicos."
Na casa diminuta e na sala que vira tela estão propostas antagônicas de um mundo medido em escala doméstica. Do exercício sutil das miniaturas aos excessos coloristas, salas, quartos, portas e porões dão as coordenadas dessa arquitetura caseira a serviço da estética -a cartela opaca da cidade contraposta aos gritos dos verões e invernos luminosos do Nordeste.
ROCHELLE COSTI e DELSON UCHÔA
Quando: ter. a sex., 10h às 19h; sáb., 11h às 17h; até 31/7
Onde: Luciana Brito Galeria (r. Gomes de Carvalho, 842, tel. 3842-0634)
Quanto: entrada franca
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