segunda-feira, 13 de julho de 2009

O último grito


Projeto de intervenção pública do artista brasileiro Henrique
Oliveira, que fará parte da próxima edição da Bienal do Mercosul

Silas Marti da Folha de S. Paulo


Grito e escuta. De uma ponta a outra, quase 200 artistas estão escalados para a próxima Bienal do Mercosul, divididos entre aqueles que berram e os que absorvem o impacto.
Na véspera do anúncio oficial, marcado para amanhã em Porto Alegre, a Ilustrada antecipa os principais nomes da sétima edição da mostra, que já se consolidou como um dos maiores eventos de arte contemporânea no hemisfério Sul.
Estão escalados desde jovens em ascensão -os brasileiros Henrique Oliveira e Cadu Costa e o peruano José Carlos Martinat- a veteranos, como Anna Maria Maiolino, e artistas históricos, como Flavio de Carvalho, o belga James Ensor e o americano John Cage.
Este último serve de espinha dorsal à mostra, que começa em outubro em Porto Alegre. Suas performances e composições experimentais são um roteiro para "Grito e Escuta".
"A Bienal em geral tem um interesse por tudo o que é exploração sonora", resume a argentina Victoria Noorthoorn, curadora-geral da exposição junto do chileno Camilo Yáñez.
Tanto que até uma rádio, coordenada pela artista Lenora de Barros, está no projeto, veiculando obras e intervenções sonoras uma hora por dia. "É uma possibilidade de irradiar essa Bienal", diz Noorthoorn. "Ela vai estar no ar."
Não é a primeira vez que isso acontece. A última Trienal de Luanda, evento bem menos conhecido, programou intervenções em rádio e televisão. Questões sonoras, aliás, já estavam de volta com força total num revival do gênero no início desta década, com mostras emblemáticas em museus e galerias de Londres e Nova York.
Também se repete a estrutura da mostra. A exemplo da Bienal de Lyon e outras mostras, um time de dez artistas, no lugar de curadores, cuidou da seleção de nomes para a exposição. Entre eles, estão os brasileiros Artur Lescher, Laura Lima e Lenora de Barros, o colombiano Bernardo Ortiz e o mexicano Erick Beltrán.
É um time que reflete em parte a origem dos escolhidos. O Brasil é o país mais bem representado na lista, seguido de Argentina, Chile e Colômbia. "Sabemos que uma bienal com curadoria de artistas não é uma novidade", diz Noorthoorn. "Não temos nenhuma pretensão de originalidade."

Exposição crua
De fato, a pretensão é outra. Querem fazer o artista aparecer menos como autor e mais como agente cultural. "Não há nenhum artista homenageado, nenhuma individual", adianta Camilo Yáñez, artista e curador-geral. "São todos nomes que estão numa posição transversal, como John Cage."
"Ele marcou a queda do egocentrismo, negava a autoria em nome de uma arte social", diz Noorthoorn sobre o americano, que terá duas de suas performances refeitas na mostra. "Não é só o artista que grita, eles renunciam aqui ao capital técnico e simbólico, fazem uma exposição mais crua, sem ornamentos, retórica e acessórios."
Ajuda nessa crueza o fato de muitos dos quase 200 nomes na mostra serem estreantes em bienais, marcando um diálogo fresco com obras dos mestres.
"Queríamos uma bienal para dar valor e espaço a gente excepcional que não teve reconhecimento", admite Noorthoorn. "Se tivéssemos seguido ao máximo nossos instintos, teríamos só artistas estreantes."
Ainda em sintonia com a proposta central da Bienal do Mercosul, de exibir e contextualizar a produção latino-americana, a mostra tenta trazer à tona alguns nomes esquecidos, como o pioneiro chileno da videoarte, Juan Downey, e o compositor brasileiro Guilherme Vaz.
Artistas conhecidos em países vizinhos e pouco vistos no Brasil também têm vez. O artista e estilista argentino Sérgio De Loof, conhecido por seus desfiles-protesto, planeja um happening para a exposição.
Extrapolando o campo das artes para outras esferas, o coreógrafo brasileiro Luiz de Abreu também fará uma performance na Bienal, marca de uma vontade multidisciplinar que volta e meia contamina o campo das artes plásticas.
"Não é um interesse por sair das artes visuais, e sim postular que as artes plásticas trabalham com outras disciplinas", diz Noorthoorn. "Não sei se acreditamos tanto numa divisão entre essas disciplinas."

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