terça-feira, 17 de novembro de 2009

Tunga surpreende com exibição de série de aquarelas

Artista mostra cerca de 30 trabalhos dos últimos cinco anos, entre os quais garrafas "decoradas" com cristais, aço e urina


Obra, que usa elementos de sexo e escatologia, é reunida em livro-catálogo com aproximadamente 60 imagens e texto do autor 





Sem título , 2005 - aquarela sobre papel de algodão - 45 x 31 cm

Para um artista que habituou o público a esperar por performances cinematográficas, instalações de grande porte e objetos complexos, Tunga inaugura amanhã, na galeria Millan, em São Paulo, uma exposição supreendente.

A narrativa tumultuária dá lugar à atmosfera de serenidade sugerida por uma série de mais de 30 aquarelas, em tons claros e diluídos, em formato de 30 cm x 40 cm. 
São pequenas cenas que podem despertar, ao primeiro olhar, reminiscências da infância, livros de fábulas e ilustrações encantadas. A repetição, em várias delas, de uma palmeira poderá ser associada à obra da modernista Tarsila do Amaral -e o autor concordará.


De perto, porém, não são tão normais. A serenidade se não é enganosa, não é plena: o observador logo identificará conflito e perceberá que a suavidade dos tons envolve situações de sexo e escatologia.


São, afinal, trabalhos de Tunga, um dos principais nomes da arte contemporânea brasileira e internacional, que desde a década de 70 concebe uma poética perturbadora, marcada pela ousadia, pela potência das formas e pela capacidade de nos transportar à terra dos mitos, dos sonhos e pesadelos.


"A arte é uma continuação do processo de reflexão, que vai se desbloqueando e te pondo em contato com outros universos", diz o artista, que realizou as aquarelas ao longo de cinco anos e chamou-as de "phanografias" ("phanos", do grego, significa luminoso).


A origem das "phanografias" é relatada num livro-catálogo que reúne a série completa de imagens -cerca de 60. Um texto de Tunga nos fala, em tom fabuloso, de uma garrafa de cristal, posta sobre sua mesa de trabalho, que ele se pôs a decorar de modo bizarro, utilizando coisas como correntinhas e fragmentos de ímã, até torná-la uma espécie de talismã.


Certo dia, premido pela vontade de urinar, decidiu fazê-lo na garrafa. Tomado por uma força autoral estranha, que parecia não ser sua, supreendeu-se com o fato de o objeto ter adquirido ares de acabado, "se configurando como uma lamparina" a refletir "luz agradável de tom amarelado".


Ao expor a tais reflexos o papel úmido de uma aquarela sobre a qual trabalhava, o artista teria verificado que uma forma fora impressa. Sua garrafa transformara-se num "phanoscópio de projeção".


Há algo de borgiano nessa história, que trapaceia com realidade e ficção, mas isso também faz parte da poética de Tunga. Fato é que ao lado das aquarelas, ele também expõe três garrafas, como as que descreve no texto -"decoradas" com âmbar, cristal de rocha, aço, urina e outros materiais.


Elas estarão acondicionadas em caixas cujas portas laterais podem ser retiradas ou substituídas por espelhos.

SERVIÇO

QUASE AURORA - TUNGA
Quando: abertura amanhã, às 20h; de seg. a sex., das 10h às 19h, e sáb., das 11h às 17h; até 19/12
Onde: galeria Millan (r. Fradique Coutinho, 1.360, tel. 3031-6007); livre

Marcos Augusto Gonçalves da Folha de S. Paulo

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