segunda-feira, 27 de julho de 2009

Coreógrafo norte-americano Merce Cunningham morre aos 90 anos

O coreógrafo Merce Cunningham, considerado um dos grandes nomes da dança contemporânea, faleceu em Nova York aos 90 anos, anunciou nesta segunda-feira a fundação que leva seu nome.

Duas imagens de arquivo mostram a coreógrafo americano Merce Cunningham; à esquerda, uma foto de 1973, e à direita, outra de 1988 Cunningham morreu nesta segunda (27) aos 90 anos

"É com grande pesar que informamos o falecimento de Merce Cunningham, que morreu serenamente em sua casa durante a noite por causas naturais", declarou a Fundação Cunningham Dance Foundation e a Merce Cunningham Dance Company em seu comunicado conjunto.

O texto elogia a contribuição artística de Cunningham, afirmando que ele "revolucionou as artes visuais e do palco, não por ser meramente iconoclasta, como também para alcançar a beleza e o assombro de explorar novas possibilidades".

Merce Cunningham em 1995

Em sua cadeira de rodas, o lendário coreógrafo continuou dirigindo até seus últimos dias no West Village sua própia companhia, fundada em 1953 como um laboratório do movimento aberto à inovação e experimentação.

Nascido em 1919 em Centralia, no Estado de Washington, Cunningham estudou balé em Seattle antes de ser solista na companhia da pioneira da dança moderna norte-americana Martha Graham, entre 1939 e 1945.

Em 1944 aconteceu o encontro que marcaria sua vida pessoal e artística, ao realizar um primeiro espetáculo individual com música do compositor John Cage, que viria a ser seu parceiro até a morte deste último quase meio século depois, em 1992.

Em sua fundação, Cunningham criou mais de 200 coreografias, muitas das quais foram apresentadas em turnês que o tornaram famoso em todo o mundo.

Esculturas em jogos de escalas

O carioca José Damasceno expõe três séries de novos trabalhos, após quatro anos de ausência

Maria Hirszman do Estadão

A mostra Complementar, que José Damasceno acaba de inaugurar no Galpão Fortes Vilaça, quebrando um jejum de quatro anos sem realizar exposições em São Paulo, é um interessante exercício de concisão, que revela muito de sua forma de pensar e fazer arte. Com apenas três trabalhos, ou séries, a mostra trabalha questões recorrentes na trajetória do artista carioca, como o jogo entre diferentes escalas, a elaboração de ordens geométricas e espaciais, uma atuação na fronteira entre o mundo da representação e o mais abstrato nível projetivo.

Projeto-Objeto, 2006 - Papel milimetrado, acrílico, mármore e madeira - 50 x 70 x 12 cm

O mais impactante deles, que dá título à mostra, é composto por uma série de mais de 50 cilindros, em dois diferentes tamanhos, que literalmente pontuam o amplo espaço do galpão, fixando-se no chão e parede de forma a criar relações de escala e perspectiva. "Afinal, o que é o espaço? Ele pressupõe a existência de coordenadas diferentes e produzir; descobrir essas coordenadas me interessa bastante", sintetiza. Esse trabalho remete a outras experimentações desenvolvidas pelo artista ao longo do tempo, na tentativa de potencializar e investigar as relações espaciais, como, por exemplo, na instalação composta por uma série de vírgulas em mármore afixadas nas paredes de um galpão na 4ª Bienal do Mercosul (2003). Mas agora o trabalho adquire um caráter ainda mais desafiante, ao deixar de lado o caráter metafórico, gráfico, da vírgula e substituir o nobre mármore pelo industrial polipropileno.

Projeto-Objeto, 2007 - Papel milimetrado, bronze, acrílico e madeira - 103.5 x 143.5 x 16 cm

Como durante muito tempo não teve ateliê, Damasceno habitou-se a desenvolver seus trabalhos - muitas vezes grandiosos - por meio de desenhos, esboços e projetos, vendo o resultado final apenas no espaço expositivo. Essa estratégia acabou tornando-se elemento fundamental do segundo grupo de obras que o artista expõe agora. Iniciada em 2006, os trabalhos da série Projeto-Objetos tem por base exatamente a estrutura do sistema de representação projetiva. O artista parte sempre de uma unidade similar - a caixa de madeira da moldura - e da base reticulada do papel milimetrado. A partir daí, derivam as combinações mais variadas, investigações amplas sobre os mais diversos sistemas de representação, mesclando abstrações de caráter construtivo a poéticas figuradas, de caráter até lírico como a tentativa de fuga da estatueta antiga de mulher, que parece tentar escapar do mundo abstrato e frio da caixa de vidro. "A pessoa é desafiada a tentar entender tudo isso", afirma o artista, que também se considera de certa forma um espectador em sua própria exposição.

Satélite, 2008 - Ferro e cartões postais - 15,30 x 19,80 cm

Satélite é o terceiro trabalho da exposição. Trata-se de uma estrutura semelhante a um mostruário de cartões-postais, mas cuja haste foi tão prolongada que se torna impossível alcançar os cartões, lá no alto. Mais um dos jogos de escala de Damasceno, com o intuito de estimular a percepção do espectador e que ele considera totalmente natural em seu trabalho. "Afinal, sou um escultor", brinca.

Quem se interessar em ter a imagem exibida pode adquiri-la por um preço "de custo" e a receberá pelo correio ao fim da exposição. Trata-se de uma única e bela foto em preto e branco, feita do mesmo mostruário, colocado na praia do Leme (Rio) e tendo por fundo o mar e o céu. Instigante transformação da paisagem em matriz de representação do espaço, reforçada ainda mais pela circularidade sem fim da linha do horizonte, quando disposta nos dispositivos da estrutura metálica circular.

Essa é a única obra da exposição que não é inédita, e foi concebida para a grande exposição individual realizada pelo artista no Museu Reina Sophia, em Madri, por ocasião do Ano do Brasil na Espanha, em 2008. Essa mostra foi tomada como uma confirmação da posição de destaque de Damasceno no cenário internacional. Em vez de assustar-se ou fascinar-se com tal situação, o artista procura encarar essa fase promissora com distanciamento, considerando o sucesso como mais um fator da série de "armadilhas" que se colocam ao artista ao longo de sua trajetória. "Não quero cumprir com expectativas que são depositadas em mim, mas estar o mais próximo das questões que me motivam", explica.

Serviço

José Damasceno. Galpão Fortes Vilaça. Rua James Holland, 71, B. Funda, 3392- 3942. 10 h/ 19 h (sáb. até 17 h; fecha dom.). Até 29/8


EXCELENTE

Crítica/"Pedro Weingärtner"

Pinacoteca relembra pintura de gaúcho
Mostra faz panorama de Weingärtner, cuja arte é descritiva e moralizadora

Obras do artista, do início do século 20, são resumo do que a pintura poderia ter sido se os movimentos de vanguarda não surgissem

por Tadeu Chiarelli

Em 10 de dezembro de 1910 foi inaugurada a terceira exposição do gaúcho Pedro Weingärtner em São Paulo. Apresentando pinturas com temáticas variadas, a mostra atraiu muitos visitantes, tendo vendido, no final, 50 das 52 obras expostas.
Se isso não basta para aferir a importância do pintor para São Paulo, lembro uma nota de "O Estado de S. Paulo" do dia 28 daquele mês, exortando o governo estadual a comprar o tríptico "A Fazedora de Anjos" para a Pinacoteca: "Deixá-lo sair de S. Paulo seria erro imperdoável (...) poucos trabalhos se prestarão tão bem a figurar como este numa galeria pública: educa pela arte superior com que é feito e educa pela elevada moral que o inspirou".

Interior com Figuras, 1907 , óleo s/ tela, 49 x 99 cm - Acervo IA - UFRGS

Desde 1911 pertencente à Pinacoteca, "A Fazedora de Anjos" sintetiza duas questões importantes para a pintura do início do século 20: primeiro, reforça o caráter descritivo da pintura da época que, acossada pela fotografia e pelo cinema, transborda o mimetismo característico da pintura ocidental para o servilismo copista; segundo, une a essa exacerbação da mímese a função exemplar que a arte sentia-se obrigada a exercer, apesar da falência dessa condição a partir das transformações do século 19.

Maricás, 1911, óleo s/ tela, 35 x 60 cm - Acervo IA - UFRGS

Entre anedótica e moralista, "A Fazedora de Anjos" manteve-se durante cem anos como uma das obras mais admiradas da Pinacoteca justamente por ser um resumo do que, para o público, a pintura poderia ter sido se os influxos das vertentes artísticas que vieram depois não desviassem seu rumo. E, para parte desse público do museu, a obra de Weingärtner e toda a compreensão do que a arte deveria ou poderia ter sido ficou resumida àquela pintura.
É por isso que a retrospectiva que a Pinacoteca inaugurou sobre o artista deve ser visitada. Ela apresenta um panorama da sua pintura, possibilitando conhecer esse artista que constituiu sua obra nos padrões de um gosto eclético, crente de que a arte devia ser descritiva e, ao mesmo tempo, moralizadora. E, dentro dessa dicotomia, Weingärtner é mestre.

Bailarinas, 1896, óleo s/ tela, 23 x 36 cm - Acervo IA - UFRGS

Parte de suas pinturas possui uma "moral da história", deliciosa para o público atual, menos "inocente". Ter trabalhado para atender ao gosto simples dos burgueses ricos e ignorantes não o impediu, no entanto, de provar que era qualificado também fora dos padrões que elegeu para alcançar o sucesso. "Paisagem com Árvores", por exemplo, atesta a desenvoltura com que manejava os pincéis na interpretação do aparente. Por essas e outras, o público paulista deve, cem anos depois, prestigiar de novo Weingärtner, visitando uma das exposições mais importantes do ano.

PEDRO WEINGÄRTNER: UM ARTISTA ENTRE O VELHO E NOVO MUNDO

Quando: de ter. a dom., 10h às 18h; até 9.8
Onde: Pinacoteca do Estado (praça da Luz, 2, tel. 3324-1000)
Quanto: R$ 6, grátis aos sábados
Avaliação: Ótimo

TADEU CHIARELLI é diretor do departamento de Artes Plásticas da ECA-USP

Presidente da Bienal toma posse sob dúvidas



fonte: Folha de S.Paulo

Terá uma sombra de dúvida a posse do presidente da Fundação Bienal de São Paulo, marcada para hoje à tarde. O empresário Heitor Martins, sua diretoria e os conselheiros que indicou para a fundação vão assinar os termos de posse sem um parecer favorável do Ministério Público Estadual, que questionou em ofício de 17 de julho a formação dessa diretoria.

O MP tem até sexta-feira desta semana para emitir um parecer depois que pediu esclarecimentos ao conselho da fundação sobre o contrato da mulher de Martins com a Bienal, o número de diretores estatutários, o aumento no número de conselheiros e a isenção deles.

Caso seja favorável o parecer que não saiu até o fechamento desta edição, os eleitos serão oficializados no cargo. Caso contrário, a posse hoje será só uma formalidade e poderá ser suspensa pelo MP, que ainda analisa as respostas da Bienal às perguntas feitas no ofício.

Essas respostas estão em carta que o presidente do conselho da Fundação Bienal, Miguel Pereira, enviou ao MP na terça-feira da semana passada.

Na última sexta, Martins esteve com a promotora Ana Maria de Castro Garms, curadora de Fundações. Estava acompanhado do ex-presidente da Bienal, Manoel Pires da Costa.

"A questão do ofício está sendo tratada pelo conselho e achei interessante ir lá me apresentar antes de tomar posse", diz Martins à Folha. "Eles fizeram algumas perguntas, e o conselho respondeu essas perguntas. Estivemos lá por 50 minutos e passamos 40 deles falando sobre a próxima Bienal."

Segundo Martins, não há "sinalização de problemas" por parte do MP. "A ideia é que a posse seja feita", diz. "Não estamos vendo nenhum fato novo que altere esse curso."

"A reunião de posse vai acontecer hoje porque é quase certo que a resposta do Ministério Público não vai ser uma negativa", diz Miguel Pereira, presidente do conselho da Bienal.

Saldo devedor

Mas, segundo apurou a Folha, pendências financeiras da Bienal com Manoel Pires da Costa podem dificultar o processo de transição. O ex-presidente tem R$ 500 mil a receber da fundação, uma dívida da Bienal com sua empresa TPT, que editava a revista "Bien'Art", publicação da Bienal de São Paulo.

No Termo de Ajustamento de Conduta que firmou com o MP em 2007, Pires da Costa, que se autodenunciou então à Promotoria por violar o estatuto da Bienal ao contratar parentes e a própria empresa, renunciava a valores que tinha a receber "exceto o custo das edições da 'Bien'Art' já editadas".

"Eu abri mão de valores altíssimos, fiz questão de abrir mão", diz Pires da Costa à Folha. "Concluiu-se que a minha empresa é credora de um valor, e de outro valor eu abri mão."

Além desse montante, pessoas ligadas à Bienal dizem que Pires da Costa também quer receber R$ 100 mil que pagou do próprio bolso por um parecer jurídico que encomendou ao advogado José Tavares Guerreiro, que o defendia da rejeição das contas de sua gestão.

Outros dois pareceres foram apresentados na reunião do conselho, em julho de 2007, que julgou a reeleição de Pires da Costa à presidência da fundação e as contas de sua administração, mas só o encomendado por Pires da Costa foi cobrado --os demais não tiveram custo financeiro para a Bienal.

Pires da Costa nega que esteja cobrando esse valor. "É a mesma coisa que andar de táxi [e pagar do próprio bolso]", diz. "Existe lá um recibo pago por mim, está no caixa. Se amanhã entenderem que isso pode ser restituído, eu recebo, se não puder, eu não recebo. Isso é um assunto acabado, liquidado."

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Cinco confrontos com Gary



Gary Hill, celebrado criador no campo da arte multimídia, inaugura no Rio a mostra O Lugar Sem o Tempo, segunda individual que traz ao Brasil e que estará em São Paulo em janeiro

Camila Molina, RIO


Gary Hill, Viewer, 1996


Com suas videoinstalações, o americano Gary Hill quer promover confrontos: pode ser barulhento e violento, como na obra Wall Piece (2000), feita da imagem de um homem que se joga contra a parede, falando a cada vez uma palavra diferente (foto maior da página); ou algo silencioso e desconcertante, como Viewer (1996), projeção, em telas que somam 14 metros, de uma fila de 15 homens, trabalhadores das camadas subjugadas e exploradas, que encaram o público, quase imóveis. Confrontar, para Hill, é a raiz da interatividade - e é sua maneira de "instigar acontecimentos" na mente das pessoas, trazer à tona os "interstícios de situações". Como diz ao Estado, usando outra expressão curiosa, ele quer promover a "sanfonização do tempo", alongando-o para mexer com nossa percepção.

Quebrando a barreira do que o enclausuraria no campo do vídeo, ou da arte tecnológica, o artista multimídia Gary Hill está inscrito na história da arte contemporânea como um criador já antológico, alguém que, não por acaso, faz parte da geração de Bill Viola e Bruce Nauman, outras duas referências para qualquer que seja o pensamento artístico atual. Por isso, é de se celebrar que este californiano, de 58 anos, que foi skatista e surfista, esteja agora pela segunda vez no Brasil, depois de um pulo de mais de uma década, quando fez por aqui, em 1997, sua primeira mostra individual, O Lugar do Outro.

Hoje, às 19h30, Gary Hill inaugura no espaço Oi Futuro, no Rio, a exposição O Lugar Sem o Tempo, formada por cinco grandes videoinstalações, entre elas, Wall Piece e Viewer, e ainda Accordions - The Belsunce Recordings (2001/2002), Up Against Down (2008) e Language Willing (2002). Em sua passagem pelo País, ele faz também duas palestras, uma amanhã, às 18 horas, no Oi Futuro (Rua Dois de Dezembro, 63, Rio); e outra na quarta-feira, às 19 horas, no Museu Oscar Niemeyer de Curitiba (Rua Marechal Hermes, 999).

Em 1997, o videoartista e produtor Marcello Dantas realizou a mostra O Lugar do Outro, exibida no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio e no Museu de Arte Moderna de São Paulo, com quatro obras de Hill. "Quando voltei de Nova York, no início dos 90, a gente estava na porta da história da arte contemporânea, coisas novas estavam acontecendo como a explosão do próprio Gary Hill, Bill Viola, Jenny Holzer. A gente não tinha informação, não tinha internet. Hoje eles se tornaram a coisa mais importante da arte e me deu a vontade de restabelecer esse link, entender até o que aconteceu com a nossa percepção. Quando você vai a uma Bienal de Veneza, ou à Bienal de São Paulo, o vídeo, a arte eletrônica viraram a coisa", afirma Dantas.

Para ele, curador também agora de O Lugar Sem o Tempo, orçada em R$ 500 mil e que a partir de janeiro de 2010 será exibida no Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo, Hill está entre os artistas que trabalham na chamada "time based art" ou arte em que a questão do tempo é fundamental, "seja lá qual for o suporte".

"Há duas questões específicas no trabalho do Gary que podem ser vistas nessa exposição: obras em que ele encara o outro e, por outro lado, obras que são muito performáticas e nas quais ele lida com o si mesmo, ou seja, com o próprio corpo, coloca e confronta o outro", tenta explicar Dantas, ressaltando também um caráter sensorial das videoinstalações do artista. Gary Hill, de forma simples, explica a raiz do confronto: "Quando encaramos o outro, refletimos sobre as verdadeiras ideias que temos de nós, fazemos essa projeção."

Escultor por formação, Gary Hill, que vive desde 1985 em Seattle, fez sua primeira videoinstalação, Hole in Wall, em 1974, obra que na época quebrou o muro que ainda emperrava a aceitação do vídeo como arte. Nascido em Santa Monica, na Califórnia, em 1951, ele se mudou para Woodstock, no Estado de Nova York, no final da década de 1960, onde começou a experimentar o vídeo como ferramenta. "Qualquer um que use a mídia de sua época, que faz filmes, está esculpindo o tempo, exceto os que são feitos em Hollywood", diz Gary Hill, concluindo que, unindo a tecnologia, sempre pensa seus trabalhos como um escultor. "Wall Piece, em que o homem bate seu corpo contra a parede enquanto diz uma palavra, vejo como algo escultórico, penso em como, com essa ação, se pode mudar a forma de uma palavra."

Sempre que se fala na obra do artista, explicita-se que sua pesquisa está fincada na relação entre a imagem e a linguagem. A questão da palavra, portanto, na obra de Hill - que faz seus trabalhos em colaboração com escritores e poetas - é fundamental. "O que é poesia e o que ela pode ser? A maneira como as palavras trabalham em nossa mente e no espaço, quando se lê, se escreve, se descreve, se pensa, é muito diferente, acontece em outro nível. Linguagem, poesia e pensamento têm vizinhança estranha", afirma. No texto de Wall Piece, por exemplo, Hill escreve: "Uma palavra vale um milésimo de uma imagem. Embasbacar-me deixou de ser uma opção. De certa forma, estou cego. Vivencio o tempo por meio de uma série de imagens que conheço desde sempre. Mas é exatamente esse ?desde sempre? que me assombra." Nas camadas do alongamento do tempo e da percepção, algo pode acontecer e Hill arremata: "Quando você perde as palavras é quando experimenta a verdadeira natureza da linguagem."

Entenda Cada Uma das Videoinstalações da Mostra

VIEWER (1996): Conhecido trabalho do artista, é uma grande obra que ocupa cerca de 14 metros de uma sala e é feita a partir de cinco videoprojetores. Em escala humana real, homens identificados como trabalhadores que podemos dizer serem das minorias raciais - imigrantes latinos, etc. - estão em fila, de frente para os espectadores e encarando-os. Eles ficam quase imóveis porque seus gestos são apenas aqueles relacionados à ação involuntária de descanso do corpo. Nesse trabalho, silencioso, simples e potente, Hill joga com a questão do "encarar o outro" - afinal, quem é o espectador de quem?

UP AGAINST DOWN (2008): Este é um trabalho performático e no qual está o próprio Gary Hill. Imagens de partes de seu corpo são projetadas em diferentes lugares, todas elas em cenas de pressão do corpo em tensão com um espaço neutro. A obra também tem o uso do recurso do som.

LANGUAGE WILLING (2002): O poeta australiano Chris Mann recita texto atuado por um par de mãos que mexem dois grandes discos projetados em grande formatos dispostos lado a lado. Os discos são cobertos com papel de parede padrão floral, um vermelho e outro um branco creme. A ação é entremeada com som, que fica mais e menos contundente, criando situação perturbadora.

ACCORDIONS (2001/2002): A obra foi gravada na pequena Belsunce, comunidade franco-argelina em Marselha. O trabalho, formado por cinco projeções não sincronizadas de imagens e sons, é feito a partir de cenas do cotidiano da vida no bairro.

WALL PIECE (2000): Também uma obra diretamente performática, é a projeção da imagem de um homem, de calça, paletó e camisa, que vai se jogando, como flashes, contra uma parede. A ação é acompanhada, a cada vez, de uma palavra pronunciada em voz alta, depois se transformando em texto.

Fundação Bienal se explica ao Ministério Público

Ana Paula Souza e Silas Marti
da Folha de S.Paulo

A seis dias da tomada de posse da nova diretoria, presidida por Heitor Martins, a Fundação Bienal de São Paulo está às voltas com pedidos de explicação do Ministério Público.

Em ofício enviado à Bienal na sexta, o MP questiona o contrato da mulher de Martins com a fundação, o aumento no número de conselheiros, sua isenção em relação à diretoria e o número de diretores estatutários.

A mulher de Martins, Fernanda Feitosa, aluga o pavilhão para realizar a feira SP Arte. Pelo estatuto recém-aprovado pela Fundação Bienal, deveria cair o número de conselheiros de 50 para 40. Martins, no entanto, indicou seis novos nomes para integrar o grupo.

Após receber as respostas da Bienal, o MP decidirá se aprova ou rejeita as atas da reunião que elegeu a nova diretoria em 28 de maio. Se rejeitadas, a posse, prevista para a próxima segunda, seria suspensa. "A data de posse está mantida. Só por ordem do MP haveria um adiamento", diz Miguel Pereira, presidente do conselho.

Ele enviou ontem ao MP uma carta de sete páginas em que procura responder às perguntas da promotora Ana Maria de Castro Garms e traça um histórico da Bienal, enredada em problemas administrativos e denúncias de irregularidades.

"O contrato [de Fernanda Feitosa] foi renovado ainda na gestão comandada pelo Manoel Francisco Pires da Costa e se estende até o ano de 2015", afirma Pereira. "Nenhuma ingerência teve Heitor Martins na discussão das cláusulas."

Ao citar Martins, o presidente do conselho diz que o empresário foi o único a aceitar o posto, lembrando que, antes dele, todos os postulantes "acabavam por desistir". A única exigência de Martins foi autonomia para "formar uma sólida corrente de apoio". "Tal equipe não se cingia a quatro ou cinco pessoas, mas abrangia um número maior", afirma Pereira.

Outros conselheiros e pessoas ligadas à Fundação Bienal dizem que houve, no entanto, um atraso no registro do novo estatuto e os conselheiros indicados por Martins puderam entrar para o grupo ainda sob o estatuto antigo, que previa sete lugares vagos.

"O conselho não foi incongruente quando antes tinha dito que não iria preencher as vagas e depois resolveu preenchê-las", diz um conselheiro ouvido pela Folha.

"Nos dois momentos, ele agiu pensando no bem da fundação, na necessidade de aportes financeiros." Um dos conselheiros indicados por Martins, Tito Enrique da Silva Neto, do banco ABC Brasil, já doou, via Lei Rouanet, R$ 300 mil para ajudar a sanar as dívidas da Bienal.

Pelo em ovo

Segundo apurou a Folha, alguns conselheiros veem no questionamento do MP uma manobra da atual gestão para adiar a posse de Martins. "Alguém está interessado em dificultar as coisas para a diretoria", diz um conselheiro que não quis ser identificado.

Em resposta, o atual presidente Manoel Francisco Pires da Costa afirma que está "trabalhando sem parar desde quando essa diretoria foi eleita". "Eu fiz tudo para que realmente acontecesse uma transferência de cargo", afirma.

Para o conselheiro Jorge Wilheim, que lançou a candidatura de Martins à presidência, o MP está "querendo procurar pelo em casca de ovo". "As perguntas feitas têm resposta; é uma coisa corriqueira", afirma. "Não estou vendo como fazer grande drama em torno disso."

sexta-feira, 17 de julho de 2009

British Council International seleciona curador para mostra em galeria londrina

O British Council International promove em parceria com a Whitechapel Gallery (Londres/Inglaterra) o “Fifth Curator”, uma competição para curadores que aceita propostas até 04/09/09. Os projetos devem selecionar obras para uma exposição a partir da coleção do British Council, composta por 8.500 trabalhos de arte britânica dos séculos 20 e 21. Os curadores candidatos devem escrever e falar em inglês. Os interessados poderão visitar a coleção pessoalmente ou via internet. Em novembro de 2009 ocorre uma pré-seleção de seis projetos. A mostra, que ocorrerá em abril de 2010, será a quinta da série "Passports - Great Early Buys from the British Council Collection", que já teve seleções de Michael Craig-Martin, Tim Marlow, Paula Rego e Jeremy Deller e Alan Kane.

Mais informações:
British Council,
10 Spring Gardens,
London SW1A 2BN
tel.: +44(0)20 7389 3031
Contato: Emma Williams
emma.williams@britishcouncil.org
www.britishcouncil.org/collection

Iran do Espírito Santo expõe na Artur Fidalgo


O artista paulista Iran do Espírito Santo apresenta a quarta versão de uma série de pinturas murais, intitulada ‘En Passant”, além de esculturas e desenhos de sua recente produção.

imageEssas obras lidam com idéias ligadas a densidade, transparência, luz e sombra, assim como sua relação com o espaço real da galeria.

Iran trabalha constantemente com códigos de representação. O artista transforma objetos comuns em modelos ideais, tangenciando a forma geométrica pura, pelo domínio absoluto da técnica e da potencialidade de cada material.

Outras obras dialogam com a arquitetura por meio da intervenção direta sobre as paredes; da proporção entre as escalas do objeto e o espaço, ou ainda pela alteração da forma como o espaço é visto.

A inauguração está marcada para 22 de julho, na Artur Fidalgo Galeria de Arte, em Copacabana.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Burle Marx 100 anos: obra em ''constante vaivém''

Mostra no MAM, que celebra centenário do artista, revela várias áreas de atuação

Camila Molina do Estado de S. Paulo

Ao lado de Lucio Costa e Oscar Niemeyer, Burle Marx foi um dos pilares que deram "sotaque particular e original" ao movimento moderno arquitetônico trazido por Le Corbusier, como afirma Lauro Cavalcanti, diretor do Paço Imperial, no Rio, e curador da mostra Roberto Burle Marx 100 Anos: A Permanência do Instável, que será inaugurada hoje no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Nacionalmente e internacionalmente, Burle Marx ficou reconhecido como dos grandes paisagistas - responsável por projetos que se tornarm sua marca, como, no Rio, o do Parque do Flamengo, o da calçada da Avenida Atlântica e do Palácio Capanema, então Ministério da Educação e Saúde, e dos jardins da Pampulha, em Belo Horizonte -, mas ele foi um criador muito além desse campo. "Indisciplinado e workaholic", como diz Cavalcanti, Burle Marx (1909-1994) tem uma produção que compreende a pintura também como parte importante de sua trajetória, a gravura, e ainda incursões no design de jóias e de vasos, de cenários e figurinos e a realização de belas tapeçarias. É essa faceta múltipla que ressalta na mostra feita especialmente para celebrar o centenário do artista, a ser completado em 4 de agosto.

Há uma definição precisa do urbanista Lucio Costa para a produção de Burle Marx, estampada logo no início da exposição: sua obra é "um constante vaivém" entre o paisagismo, a botânica, o desenho, as artes plásticas, enfim. Inevitavelmente, é esse movimento que se sente no percurso de toda a Grande Sala do MAM: o abstracionismo das cores dos quadros do artista se refletem nos vários guaches sobre o papel de seus projetos paisagísticos e até na monumental tapeçaria de 1969, com quase 25 metros de comprimento. Pertencente à prefeitura de Santo André, a tapeçaria é um grande destaque (com o perdão do trocadilho) da exposição, exibida anteriormente no Paço Imperial, no Rio, onde recebeu 180 mil visitantes - ela também é acompanhada de um alentado livro, editado pela Rocco e com textos de diversos especialistas.

Burle Marx nasceu em São Paulo, mas foi o Rio a sua verdadeira base. Também viveu na Alemanha quando jovem - uma importante experiência para sua formação -, voltando ao Brasil, em 1932, quando realizou no Recife, "terra de sua mãe", seus primeiros projetos paisagísticos. O subtítulo da mostra, a Permanência do Instável, é uma licença poética referente ao paisagista e botânico, que desde jovem, primeiramente encantado com cactos, vitórias-régias, bromélias e outras espécimes tropicais, começa a criar jardins, ou seja "composições com elementos que mudam dia a dia", como diz Lauro Cavalcanti - as plantas crescem, se transformam ao longo do tempo e como um "pintor e jardineiro prático", definiu em 1949 Claude Vincent, era esse seu desafio. A exposição é rica em tratar do paisagista Burle Marx, perpassando com documentações, fotografias (dentre elas, feitas por Gautherot e Alair Gomes) e desenhos vários de seus projetos nesse campo, públicos ou residenciais, concretizados ou não, e criados para o Brasil e para outros países.

A mostra se dedica em grande parte, também, a dar destaque para o Burle Marx "excelente" pintor - e foi esse o primeiro mote que Lauro Cavalcanti teve para conceber a exposição, há cerca de três anos. "Todos os dias ele pintava pela manhã e fazia jardins à tarde", diz o curador, afirmando ainda que o artista ficava chateado por ter sua pintura relegada a segundo plano. A mostra apresenta as telas feitas por ele da década de 1930 até o fim de sua vida (incluindo até um quadro inacabado).

FESTIVAL EM BH TERÁ MAIS DE 60 OBRAS

Sinal de que a performance vem ganhando espaço na agenda da arte contemporânea do país, começa em agosto a segunda edição da Manifestação Internacional de Performance. Idealizado pelos artistas Marco Paulo Rolla e Marcos Hill, o evento vai de 3 a 9 de agosto, ocupando espaços públicos de Belo Horizonte, o centro cultural 104 e o teatro Alterosa.
A primeira edição do evento foi em 2003 e só agora volta a acontecer. Bem maior que o festival Verbo, da galeria Vermelho, a MIP terá 40 artistas convidados, entre brasileiros e estrangeiros, e outras 22 performances escolhidas pela curadoria.
Alguns nomes escaladados entre os convidados são a turca Nezaket Ekici, a holandesa Mariëlle Videler e a brasileira Dudude Herrmann. Esses três também organizam uma série de workshops sobre performance entre 20 e 30 de julho em BH.
Outros nomes cotados para o festival são a zambiana Anawana Haloba, o coletivo goiano Grupo Empreza, as brasileiras Louise Ganz e Rose Akras, entre outros.

Crítica: Verbo 2009 por Silas Martí

fonte: Folha de S. Paulo

Ficar pelado não é sinônimo de boa performance artística

Mostra traz recorte potente do gênero, mas perde com nudez em trabalhos fracos

Bruno Fernandes/Folha Imagem
Coreografia com saliva e roupa íntima dos bailarinos da companhia francesa Les Gens d'Uterpan, que participou da última Verbo

A nudez ofuscou o que havia de bom na última Verbo, festival de performances da galeria Vermelho encerrado no último domingo. Não que o corpo tenha perdido o apelo, ainda mais no frio do inverno paulistano. Mas o que se viu, a despeito de obras mais bem acabadas de gente vestida, foi um espetáculo pueril.
Logo no primeiro dia, o português Gabriel Arantes já tinha garotas pintadas de índio com os seios à mostra. Mais constrangedor e um tanto datado, Marco Paulo Rolla levou um rapaz e outra mulher para quebrar taças -todos nus- num dos ambientes da galeria.
Foi dura a espera. Além de desviar dos estilhaços de vidro, o público, que foi minguando ao longo da performance, não respondeu às taças quebradas. Numa espécie de clímax não planejado, um dos meninos cortou o dedo num caco de vidro e concluiu o trabalho manchando de sangue os restos transparentes -devia vibrar de emoção com o acaso sofrido.
Dias depois, o holandês Anno Dijkstra esperou a sala lotar para então tirar toda a roupa. Amarrou um aparato no peito que simulava um tiro de revólver. No lugar do sangue cenográfico, um líquido dourado. Na hora em que levaria o disparo fajuto, algo deu errado. Virou então de costas para a plateia, rearmou o disparador e manchou de ouro o piso da galeria.
Era sua reinterpretação da performance "Shoot", de Chris Burden, em que o artista norte-americano, em plena Guerra do Vietnã, levou um tiro de verdade no braço -estava vestido.

Tédio e êxtase
Nua, Ana Montenegro encarou por meia hora uma plateia entediada. Era essa a performance: uma mulher pelada. No mesmo dia, Rose Akras ficou só de calcinha e pintou o corpo todo de preto, num trabalho em que evocava o êxtase das santas esculpidas pelo barroco italiano Gian Lorenzo Bernini.
Os bailarinos da companhia francesa Les Gens d'Uterpan também tiveram seu momento à vontade. De cueca e calcinha, babaram uns sobre os outros em poses contorcionistas que armaram pela galeria.
É verdade que a nudez, nesse caso, estava de acordo com o objetivo. Mas cansou a repetição, a certeza quase absoluta de que performance, no imaginário de boa parte dos escolhidos para esta Verbo, ainda é sinônimo de ficar pelado e fazer alguma coisa, qualquer coisa.

Vertente sonora
Funcionou, por outro lado, a vertente sonora desta edição. Se babando o Les Gens d'Uterpan conseguiu um impacto médio, o olhar fixo que jogava sobre os visitantes valeu mais, adensado pelos graves potentes de caixas de som espalhadas pela galeria. O mesmo valeu para Maurício Ianês, que fez reverberar pelo espaço uma sinfonia orgânica distorcida.
Daniel Fagundes, que no ano passado tentou enfiar mais de dez pessoas peladas num Fusca, orquestrou um concerto de buzinas com vários carros estacionados no pátio da galeria. Perdeu o ritmo, mas ganhou com a fusão de sua algazarra aos rojões do Pacaembu vizinho em noite de clássico.

Riso e choro
Vestidos, os espanhóis da dupla Los Torreznos transformaram a língua em instrumento abstrato em duas performances irretocáveis. Gritando "la cultura" à exaustão e, no dia seguinte, "el dinero", protagonizaram o momento mais que saudável em que a arte desceu do pedestal e riu de si mesma.
Mais para o choro, a turca Nezaket Ekici se pendurou do teto de ponta-cabeça e leu notas de agressão contra mulheres. Vestia uma burca. Não é preciso dizer que, nesse contexto, foi mais transgressora do que as várias peladas que desfilaram pelas salas da Vermelho.
A Verbo fechou ao som de uma canção triste em fita cassete, que o colombiano Ícaro Zorbar fez tocar com um mecanismo instalado num ventilador. Rolava a música e a fita magnética se desenrolava no vento em desenhos no ar -promessa sólida de que restam novos rumos para a performance.

Jean Dubuffet ganha primeira retrospectiva na América Latina


Gabriela Longman da Folha de S.Paulo

O escritório da Fondation Dubuffet fica escondido nos fundos de um prédio na região de Saint Germain de Près, em Paris. Foi dali que partiram 84 obras para a primeira retrospectiva do artista na América Latina, que abre nesta quinta-feira (16) para o público no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo.

A obra "Temps et Lieux", de 1979, que integra mostra no Instituto Tomie Ohtake

Ao lado das mostras de Matisse e Léger --ambas na Pinacoteca--, Jean Dubuffet (1901-1985) completa a trinca de grandes nomes do modernismo trazidos pelo Ano da França no Brasil. Trata-se, no entanto, de um modernista tardio --sua produção se concentra na segunda metade do século 20--, que nega aspectos do movimento e, em boa medida, prepara tendências futuras da arte.

A diretora da fundação Sophie Webel recebeu a reportagem da Folha poucos dias antes de embarcar, ela também, para São Paulo. Explicou o percurso que preparou para a mostra e as diferentes fases do artista que estarão ali retratadas. No começo, até os anos 40, Dubuffet era comerciante e pintava ao mesmo tempo. Apenas em 1942 assumiu-se como "artista" e passou a trabalhar ininterruptamente.

Esse "trabalhar" era múltiplo. Pintava, pensava, escrevia, experimentava, esculpia. No segundo núcleo, se encontram as pesquisas com texturas que fez nos anos 50 trabalhando com areia, papel, resíduo industrial, folhas secas.

Seu trabalho se aproxima e se distancia da abstração (embora rejeitasse a oposição figurativo/ abstrato). "Ele [Dubuffet] achava essa categorização redutora", disse Webel ao explicar a fase do Hourloupe. Criados entre 1960 e 1972, esses trabalhos são feitos a partir de cores puras --azul, vermelho e preto-- e de formas entremeadas numa espécie de labirinto pictórico.

As mesmas cores e tipo de forma aparecem transformados nas pinturas-fantasias-esculturas da performance "Coucou Bazar", criada em 1973 e vista pela primeira vez no Guggenheim, em Nova York, um grande destaque da mostra.

O nome da arte

Muitos mal-entendidos que cercam sua figura se associam ao conceito de "arte bruta", expressão cunhada por ele para designar a arte espontânea feita fora do circuito cultural.

"A arte não vem deitar na cama que fazemos para ela", escreveu em 1960. "Ela escapa logo que pronunciamos seu nome." Partindo dessa ideia, Dubuffet se interessou pela arte rupestre, pela arte feita por crianças, presidiários, doentes mentais. Criou importante coleção dessas obras, foi influenciado por elas, mas não deve ser classificado como artista bruto.

JEAN DUBUFFET
Quando: de terça a domingo, das 11h às 20h, até 7/9 Onde: Instituto Tomie Ohtake (r. Coropés, 88, tel. 0/xx/11/2245-1900)
Quanto: entrada franca

terça-feira, 14 de julho de 2009

Curador da Bienal de 2010, Moacir dos Anjos quer arte política



Fabio Cypriano
da Folha de S.Paulo


Política, sem a institucionalização de um museu ou o afã pelo novo de uma feira de arte. Em síntese, essas são as linhas gerais que vão direcionar a organização da 29ª Bienal de São Paulo, segundo o curador Moacir dos Anjos, anunciado nesta segunda-feira (13) pelo presidente da Fundação Bienal, Heitor Martins, conforme a Folha havia adiantado.

De Londres, via Skype, o pernambucano Dos Anjos, 46, explicou o projeto inicial que irá conduzir a preparação da mostra, ainda sem data de abertura definida, mas que deve ocorrer em fins de setembro ou começo de outubro do próximo ano.

"O Moacir é o coordenador do grupo curatorial, outros cinco nomes ainda devem ser incluídos, três deles estrangeiros. O conceito de equipe é importante para marcar um pluralismo de visões", afirmou ontem Martins, na sede da Fundação Bienal. Os demais curadores serão anunciados em agosto.

A 29ª Bienal não terá um tema específico, mas será organizada como uma "plataforma discursiva", disse Dos Anjos. "Um tema costuma constranger as obras a um ponto específico e por seu tamanho." De acordo com o projeto apresentado pelo curador, isso significa que "o aspecto central dessa plataforma será o reconhecimento do caráter ambíguo que a arte exibe desde que se viu liberta de sua função de meramente representar o mundo".

O curador trabalha a exposição com um título ainda provisório, "Há sempre um copo de mar para um homem navegar", verso do poeta alagoano Jorge de Lima. "Vamos dar ênfase à arte como produtora de uma visão de mundo que, em potência, pode transformar a realidade", disse o curador, ao explicar o caráter político da mostra.

Ao preparar o projeto da 29ª Bienal, Dos Anjos falou que teve em mente outras mostras, com as quais pretende dialogar: "Não sou ingênuo ou arrogante para achar que vou inventar a roda. A Documenta 11, de 2002, a última Bienal de Sydney, e a 24ª e 27ª Bienais de SP são as mostras que tive em mente para elaborar o projeto."

Sobre a Documenta 11, Dos Anjos ressaltou a mescla entre os vínculos estabelecidos da arte feita no presente com a produção do passado, o que deve ocorrer também na 29ª Bienal. Outro viés importante da exposição, também segundo o curador, será seu caráter experimental, que foi lembrado a partir da concepção do crítico Mário Pedrosa em sua famosa formulação "a arte é o exercício experimental da liberdade".

A produção brasileira também será fortalecida, sem ser organizada em gueto. "Pretendo romper com a leitura crítica dominante que a arte política brasileira ocorreu só nos anos 1960 e 70."

Segundo Martins, a exposição deve custar cerca de R$ 25 milhões, além de R$ 5 milhões para o setor educativo. O curador volta amanhã para Recife. Ele não terá residência permanente em São Paulo.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Viúva tira de circulação obra atribuída a Joseph Beuys



fonte DW



Beuys se apresenta: 'A revolução somos nós'

Em nome do marido, Eva Beuys zela para impedir a exposição de obras duvidosas. Como a vitrine com lixo recolhido por ele em 1973. Disputa bizarra, tratando-se de alguém que afirmava que "toda pessoa é um artista".

Não é fácil ser artista conceitual. Nem mesmo postumamente. Uma disputa em curso entre a viúva de Joseph Beuys (1921-1986) e um amigo do artista, René Block, ilustra bem os riscos dessa atividade no limiar entre as artes plásticas, a ação política e o exibicionismo pessoal.

No dia 1º de maio de 1972, Beuys realizou uma ação em Berlim intitulada Ausfegen (Varredura). Juntamente com dois estudantes, recolheu lixo das ruas do lado ocidental (capitalista) da metrópole alemã, usando uma vassoura vermelha (comunismo?). Considerando o material recolhido interessante demais para ir parar no lixo, ele o confiou a Block.

Durante 13 anos, o amigo preservou aquele cantinho em sua galeria, limpando-o periodicamente de lenços de papel, bilhetes de ônibus e outros dejetos acrescentados por visitantes distraídos. Tratava-se de preservar o lixo de Beuys em sua forma original.

Terno de feltro exposto em Santiago de Compostela

Vitrine de sucesso

Aí veio a ideia da vitrine. Segundo o jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung (FAZ), em 1985, poucos meses antes da morte do artista natural de Krefeld, seu amigo decidira arranjar vassoura, poeira, garrafas de bebida, paralelepípedos etc. numa caixa branca de madeira com janela: uma vitrine como as que Beuys empregara tantas vezes.

Block assegura: "Combinei tudo com Beuys, a coisa ocorreu de acordo com sua vontade". E, mesmo não havendo qualquer registro escrito dessa vontade, iniciou-se ali uma carreira gloriosa. Ausfegen foi exposta na Kunsthalle de Hamburgo, no Hamburger Bahnhof de Berlim, na Tate Modern de Londres e, por fim, na mostra Arte de duas Alemanhas, do Los Angeles County Museum of Art.

Entra a viúva

Em abril de 2009, quando a vitrine se encontrava a caminho da exposição Arte e Guerra Fria, no Neues Museum de Nurembergue, entra em cena Eva, a viúva de Beuys.

Ela já tolerara demais que "Varredura" fosse exposta em nome do finado. "A obra não foi autorizada, nem paga", contabiliza. E acrescenta (note-se o emprego do presente do indicativo): "Meu marido não manda expor coisas que não fez de modo algum".

Eva Beuys acha a vitrine bonita, mas "uma obra de meu marido, nessa forma ela não é". Seja como for, a peça está fora de circulação até que os respectivos advogados consigam definir a distinção entre lixo puro e um Beuys legítimo.

A César o que é de César

A viúva propõe que, caso exposta, Ausfegen seja atribuída a René Block, o qual, afinal de contas, a produziu. Este rejeita a ideia – "Todo o mundo da arte ia rir, não dá, não" – e nem pensa em vender o objeto.

Justiça seja feita: durante uma disputa anterior, ainda em 1987, o amigo do artista afirmara não tratar-se de uma autêntica vitrine beuysiana, mas sim de um mero depósito de material. Na época, a peça foi avaliada em 300 mil marcos alemães (cerca de 150 mil euros).

Finanças à parte, a atual celeuma sobre autoria e propriedade talvez não soaria tão bizarra e mesquinha, se não se tratasse justamente do legado de alguém como Joseph Beuys, que pregava que "toda pessoa é um artista".

Na realidade, apesar de propagar uma doutrina tão liberal, a vida do misto de artista plástico, performer, ativista, xamã, clown e teórico confuso tampouco foi livre de contradições. Como demonstrou o "caso da banheira suja".

Banheira suja e canto de sebo

Em 1973, sua unbetitelt (Badewanne) [sem título (Banheira)]aguardava para ser exposta em Wuppertal, por empréstimo permanente de seu proprietário, um colecionador importante. Tratava-se de uma banheira de bebê, trabalhada com pedaços de esparadrapo e bandagens.
Unschlitt/Tallow: blocos de sebo no Hamburger Bahnhof de Berlim

Paralelamente, realizava-se no local do depósito, o Museu de Leverkusen, uma festa do Partido Social Democrata (SPD). À procura de um recipiente para lavar copos de cerveja, duas deputadas depararam com a banheira "suja". Ignorantes de seu estatuto de obra de arte, elas fizeram o impensável: esfregaram-na até ficar brilhando, depois utilizando-a para seus fins pragmáticos.

Beuys foi o primeiro a não achar graça de tamanha insensibilidade artística. Seguiu-se um processo, ao fim do qual a cidade de Wuppertal, na qualidade de detentora do empréstimo, foi sentenciada a pagar 40 mil marcos ao proprietário. O artista recebeu a banheira – limpa – de volta, e refez a obra.

Treze anos mais tarde, a destruição – igualmente involuntária – de um dos numerosos Fettecke (Cantinho de sebo) de Beuys pelo zelador da Academia de Arte de Düsseldorf resultou em sentença semelhante.

Beuys e Da Vinci

No entanto, agora, mais do que nunca, seu acervo parece estar em mãos seguras. Eva Beuys tornou-se extremamente sensível para questões de propriedade intelectual, desde um prolongado – e, segundo o FAZ, "indigno" – debate com o Museu Moyland sobre se era lícito substituir uma barra de chocolate, numa instalação de Beuys, por uma imitação de papelão.

A herdeira não parece ter dúvidas sobre sua missão. Ao comentar a notoriedade de Ausfegen, ela passa por cima dos postulados do próprio marido sobre "obra" e "artista", e carrega nas tintas sem medo: "É como uma falsificação de Leonardo da Vinci que as pessoas amam mais do que o original".

Autor: Augusto Valente
Revisão: Rodrigo Abdelmalack


Críticos lançam Manifesto em Defesa da Exibição das Obras de Arte Brasileiras


Críticos de arte de São Paulo e do Rio de Janeiro lançaram em 01/07/09 o "Manifesto em Defesa da Exibição Pública das Obras de Arte Brasileiras", contra herdeiros de artistas que cobram até R$ 150 mil para autorizar a exposição de obras e a publicação de suas imagens. Depois que trabalhos de Volpi ficaram de fora de um catálogo do Instituto Moreira Salles e de problemas com imagens de Lygia Clark, o documento afirma que é "inaceitável" o "controle sobre informações e interpretações de obra e artista". A iniciativa tem o apoio de críticos de arte como Fernando Cocchiarale, Ferreira Gullar, Glória Ferreira, Guilherme Wisnik, Luiz Camillo Osório, Otavio Leonídio, Rodrigo Naves e Ronaldo Brito, entre outros.

O último grito


Projeto de intervenção pública do artista brasileiro Henrique
Oliveira, que fará parte da próxima edição da Bienal do Mercosul

Silas Marti da Folha de S. Paulo


Grito e escuta. De uma ponta a outra, quase 200 artistas estão escalados para a próxima Bienal do Mercosul, divididos entre aqueles que berram e os que absorvem o impacto.
Na véspera do anúncio oficial, marcado para amanhã em Porto Alegre, a Ilustrada antecipa os principais nomes da sétima edição da mostra, que já se consolidou como um dos maiores eventos de arte contemporânea no hemisfério Sul.
Estão escalados desde jovens em ascensão -os brasileiros Henrique Oliveira e Cadu Costa e o peruano José Carlos Martinat- a veteranos, como Anna Maria Maiolino, e artistas históricos, como Flavio de Carvalho, o belga James Ensor e o americano John Cage.
Este último serve de espinha dorsal à mostra, que começa em outubro em Porto Alegre. Suas performances e composições experimentais são um roteiro para "Grito e Escuta".
"A Bienal em geral tem um interesse por tudo o que é exploração sonora", resume a argentina Victoria Noorthoorn, curadora-geral da exposição junto do chileno Camilo Yáñez.
Tanto que até uma rádio, coordenada pela artista Lenora de Barros, está no projeto, veiculando obras e intervenções sonoras uma hora por dia. "É uma possibilidade de irradiar essa Bienal", diz Noorthoorn. "Ela vai estar no ar."
Não é a primeira vez que isso acontece. A última Trienal de Luanda, evento bem menos conhecido, programou intervenções em rádio e televisão. Questões sonoras, aliás, já estavam de volta com força total num revival do gênero no início desta década, com mostras emblemáticas em museus e galerias de Londres e Nova York.
Também se repete a estrutura da mostra. A exemplo da Bienal de Lyon e outras mostras, um time de dez artistas, no lugar de curadores, cuidou da seleção de nomes para a exposição. Entre eles, estão os brasileiros Artur Lescher, Laura Lima e Lenora de Barros, o colombiano Bernardo Ortiz e o mexicano Erick Beltrán.
É um time que reflete em parte a origem dos escolhidos. O Brasil é o país mais bem representado na lista, seguido de Argentina, Chile e Colômbia. "Sabemos que uma bienal com curadoria de artistas não é uma novidade", diz Noorthoorn. "Não temos nenhuma pretensão de originalidade."

Exposição crua
De fato, a pretensão é outra. Querem fazer o artista aparecer menos como autor e mais como agente cultural. "Não há nenhum artista homenageado, nenhuma individual", adianta Camilo Yáñez, artista e curador-geral. "São todos nomes que estão numa posição transversal, como John Cage."
"Ele marcou a queda do egocentrismo, negava a autoria em nome de uma arte social", diz Noorthoorn sobre o americano, que terá duas de suas performances refeitas na mostra. "Não é só o artista que grita, eles renunciam aqui ao capital técnico e simbólico, fazem uma exposição mais crua, sem ornamentos, retórica e acessórios."
Ajuda nessa crueza o fato de muitos dos quase 200 nomes na mostra serem estreantes em bienais, marcando um diálogo fresco com obras dos mestres.
"Queríamos uma bienal para dar valor e espaço a gente excepcional que não teve reconhecimento", admite Noorthoorn. "Se tivéssemos seguido ao máximo nossos instintos, teríamos só artistas estreantes."
Ainda em sintonia com a proposta central da Bienal do Mercosul, de exibir e contextualizar a produção latino-americana, a mostra tenta trazer à tona alguns nomes esquecidos, como o pioneiro chileno da videoarte, Juan Downey, e o compositor brasileiro Guilherme Vaz.
Artistas conhecidos em países vizinhos e pouco vistos no Brasil também têm vez. O artista e estilista argentino Sérgio De Loof, conhecido por seus desfiles-protesto, planeja um happening para a exposição.
Extrapolando o campo das artes para outras esferas, o coreógrafo brasileiro Luiz de Abreu também fará uma performance na Bienal, marca de uma vontade multidisciplinar que volta e meia contamina o campo das artes plásticas.
"Não é um interesse por sair das artes visuais, e sim postular que as artes plásticas trabalham com outras disciplinas", diz Noorthoorn. "Não sei se acreditamos tanto numa divisão entre essas disciplinas."

Bienal de São Paulo importa modelo gaúcho de gestão


Folha de S. Paulo

Não causou espanto a escolha de Justo Werlang para integrar a nova diretoria da Bienal de São Paulo. O empresário e colecionador, que esteve até agora à frente da Bienal do Mercosul, entrou na chapa do novo presidente, Heitor Martins, para modernizar a gestão fraca e datada da mostra paulistana, afundada em dívidas.
Embora evite fazer críticas às gestões de Manoel Francisco Pires da Costa, que presidiu a Fundação Bienal de São Paulo até maio deste ano, Werlang reconhece que os planos do novo presidente são parecidos com o que se fazia em Porto Alegre.
"É muito difícil falar de fora, com a visão de um outsider", diz Werlang. "Objetivamente [a nova gestão paulistana] é o que nós gostávamos de praticar na Bienal do Mercosul."
Fundado em 1997, o evento em Porto Alegre teve público comparado ao da Bienal de São Paulo em suas últimas três edições, com mais de 1 milhão de visitantes em 2003. Custou em média R$ 8 milhões por edição, com maior parte dos recursos captados via Lei Rouanet, seguida de verbas do Estado do Rio Grande do Sul e de patrocinadores -o maior deles é a empresa metalúrgica Gerdau.
A edição atual da Bienal do Mercosul está orçada em R$ 7,5 milhões e terá cerca de 200 artistas. Numa comparação rasteira, a última edição da Bienal de São Paulo custou R$ 11 milhões e teve cerca de 40 nomes.

Estrutura fixa

Segundo Werlang, manter uma estrutura fixa entre uma edição e outra da mostra é parte do sucesso do evento gaúcho. Em vez de dissolver as equipes como faz a Bienal de São Paulo, a do Mercosul mantém um projeto pedagógico funcionando, além de outros setores.
"Existe uma estrutura fixa", afirma Werlang. "Em todas as áreas, há pessoas que operam durante o período todo."
Werlang também defende o processo de escolha do curador adotado na última Bienal do Mercosul, em que um concurso internacional escolheu um projeto vencedor. Em São Paulo, a nova diretoria escolheu Moacir dos Anjos para a curadoria da próxima edição, que será oficializada hoje (SM)

Moacir dos Anjos dirige Bienal de SP


Crítico de artes plásticas foi escolhido diretamente pelo presidente da fundação, Heitor Martins, e será anunciado hoje

Dos Anjos deve indicar pelo menos mais dois nomes, provavelmente vindos do exterior, para trabalharem na 29ª edição, em 2010

Fábio Cypriano da Folha de S. Paulo

O presidente da Bienal de São Paulo, Heitor Martins, anuncia, hoje, Moacir dos Anjos como o curador da 29ª Bienal de São Paulo, que será realizada no próximo ano, segundo apurou a Folha.
Diferentemente das últimas duas edições, que tiveram seus curadores, Lisette Lagnado (27ª) e Ivo Mesquita (28ª), escolhidos por processo seletivo, desta vez a indicação ocorreu diretamente pelo presidente.
Na entrevista coletiva marcada para hoje, na sede da Bienal, Dos Anjos não estará presente. Atualmente ele vive em Londres, onde realiza um pós-doutorado em arte transnacional, identidade e nação na Camberwell College of Arts.
Segundo a Folha apurou, o curador deverá apontar nos próximos dias, ao menos outros dois curadores para trabalhar com ele na Bienal, provavelmente nomes estrangeiros.
De acordo com Martins, o motivo da indicação sem processo seletivo foi facilitar o trabalho do curador, que terá pouco mais de um ano para organizar a exposição. O atraso na escolha, contudo, não tem a ver com o novo presidente, que foi eleito há pouco mais de dois meses, por conta da difícil situação financeira em que a fundação se encontrava.
Economista por formação, da graduação ao doutorado, Dos Anjos começou a se projetar no cenário artístico como diretor do Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães (Mamam), de Recife. Entre 2001 e 2006, ele organizou mostras de artistas como Rosângela Rennó e Nelson Leirner.
Em 2004, ele foi curador da mostra Paralela, evento organizado pelas galerias paulistas simultâneo à Bienal de São Paulo, que chegou a ser considerado melhor que ela própria. Em 2006, ele foi curador da exposição de Cildo Meireles, na Pinacoteca do Estado, umas das mais importantes mostras do artista no país.
Já em 2007, foi um dos cocuradores da Bienal do Mercosul, em Porto Alegre, além de responsável pela mostra bienal Panorama da Arte Brasileira, do MAM de São Paulo, intitulada "Contraditório", também exibida em Madri, em 2008.

sábado, 11 de julho de 2009

Curador da Bienal 2010 será anunciado na segunda

LISTA TRÍPLICE
Heitor Martins, presidente da Fundação Bienal de SP, anuncia na segunda o nome do curador da Bienal de 2010. Três nomes são cotados: Tanya Barson, curadora internacional da Tate Modern de Londres, o argentino Carlos Basualdo, do Museu de Arte Contemporânea da Filadélfia, e Moacir dos Anjos, ex-diretor do Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães, do Recife.

FESTA NO PAVILHÃO
E a nova diretoria da Bienal vai fazer uma festa para 400 convidados em setembro, no pavilhão do parque Ibirapuera, para levantar fundos para a mostra de 2010, orçada em cerca de R$ 25 milhões.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Carta de ex-namorado motiva exposição de Sophie Calle em SP


Sesc Pompeia apresenta mostra idealizada a partir de mensagem de 'fora' recebida pela escritora francesa

Camila Molina, de O Estado de S. Paulo

Nilton Fukuda/AE
Sophie convidou 107 mulheres para interpretar a carta que recebeu do escritor Grégoire Bouillier

Para a artista e escritora francesa Sophie Calle, a única maneira de fazer arte é usar a narrativa e dentro desse terreno, seu artifício preferido, que a tornou mundialmente conhecida, é o de se valer de experiências de sua vida pessoal para a criação de seus trabalhos. No caso da mostra Cuide de Você, que será inaugurada nesta sexta, 10, para convidados e sábado para o público no galpão do Sesc Pompeia - e que a partir de 22 de setembro será apresentada no Museu de Arte Moderna da Bahia -, tudo gira em torno da carta que Sophie recebeu do escritor Grégoire Bouillier na qual ele rompia o romance dos dois.

"Cuide de você" ou "Prenez soin de Vous", em francês, era a frase final do "fora" mandado por e-mail. "Levei essa recomendação ao pé da letra", afirma Sophie, que convidou 107 mulheres (entre elas, as atrizes Victoria Abril, Jeanne Moreau e Elsa Zylberstein) a interpretarem a carta e, a partir desse mote, criou uma instalação com textos, fotografias e vídeos, apresentada, pela primeira vez, em 2007, na Bienal de Veneza.

Prenez soin de Vous - ou Cuide de Você - já foi exibida também em Nova York antes de chegar ao Brasil. Além de não ser uma obra inédita, há ainda o fato de Sophie Calle e Grégoire Bouillier terem dividido uma mesa de debates no último dia 4 na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), evento que tinha como apelo ser o "reencontro público" dos dois depois do rompimento.

"O fim natural dessa história foi lá", diz, agora em São Paulo, Sophie, enquanto fazia os últimos ajustes da montagem de Cuide de Você no Sesc Pompeia. Seu desapego à privacidade é tratado com naturalidade: "Não é de minha vida que se trata, não sou o tema principal", afirma a francesa ainda com um pouco de defesa contra uma visão simplista de suas criações - ela deixa para os críticos as críticas.

A artista francesa, nascida em 1953, enumera que Jerusalém, a queda do Muro de Berlim e roubos de quadros já foram temas de seu trabalhos, mas seu gosto pelo voyeurismo (de sua vida ou de outros) ou pela operação de raiz lacaniana de "dar a ver" excertos de sua vida se transformou na característica mais pungente de sua proposta de tratar a barreira entre o público e o privado. Se for para citar trabalhos anteriores, a conceitual Sophie Calle já criou obras em que coloca as anotações de um detetive que a perseguiu por um dia ou série feita a partir do pedido de que amigos, desconhecidos e a sua mãe dormissem em sua cama para que fossem fotografados e analisados por ela em textos.

Agora, como conta a O Estado de S. Paulo, está produzindo um trabalho com uma leitora de cartas de tarô: a vidente lê o futuro de Sophie e ela própria o adianta e experimenta. "O lugar que ela vê nas cartas no qual estarei futuramente, eu já vou antes a esse local e filmo e fotografo minha experiência. Parece que terei de ir ao México", diz a artista.

No caso de Cuide de Você, o ponto de partida foi esmiuçar até a exaustão a carta que recebeu de Bouillier. Mulheres escolhidas por suas profissões, ou seja, trabalhos que envolvem, de alguma forma, a relação com textos - jornalista, advogada, atrizes, cantoras, uma palhaça, cartunista, pesquisadoras de léxicos, etc, - interpretaram a carta de Sophie de maneiras diversas. Tudo se transformou numa grande instalação, não apenas com os vídeos nos quais elas aparecem fazendo suas interpretações da carta (de uma página, deve-se dizer) e com retratos de cada uma, mas com painéis nos quais estão gráficos, sentenças destacadas, cartas de tarô, enfim, uma série de ações dentro de uma estratégia de fragmentação e acumulação de um mesmo tema.

Todas as mulheres falam (ou cantam, ou gritam, etc.) o texto em sua própria língua (os vídeos são acompanhados de legendas), interpretam o mesmo de forma diferente. O "fora" ganha status dos mais diversos: vai da escala do triste à ridicularização - cópias da carta podem ser levadas pelo público.

Para cada lugar em que Sophie Calle exibe essa instalação ela propõe uma configuração. A versão para o Brasil é feita a partir das interpretações de 83 mulheres, de um pássaro e sala com seis filmes mudos. Recebe o visitante um painel com fotografias de mulheres com a carta e o vídeo no qual a atriz portuguesa Maria de Medeiros fala o texto do e-mail deitada de bruços sobre um divã - foi a forma de fazer o espectador já identificar o contexto pela fala em português. "O trabalho de Sophie Calle desmistifica a abstração que existe em torno da arte contemporânea, tem um approach com o público", diz Solange Farkas, diretora do Videobrasil e do MAM da Bahia. Cuide de Você, realização do Sesc São Paulo e um dos destaques da programação do Ano da França no Brasil, substituiu a edição que ocorreria este ano do festival Videobrasil (o próximo, em novo formato, será em 2011).

Sábado, às 15 h, Sophie Calle faz palestra no teatro do Sesc Pompeia aberta ao público. A exposição é acompanhada de uma série de encontros, palestras e atividades e cuidadoso projeto educativo. Tudo pode ser conferido no site www.sophiecalle.com.br e nele, também, as pessoas estão convidadas a criar a partir de Cuide de Você.

Sophie Calle - Galpão do Sesc Pompeia - Rua Clélia, 93, Pompeia. 3871-7700. Das 10h às 21h (dom. Até 20h;fecha 2.ª). Grátis. Até 7/9

terça-feira, 7 de julho de 2009

Exposição traz produção contemporânea de artistas argentinos

Camila Molina do Estado de S. Paulo

Tão perto e um pouco longe. O curador carioca Franklin Espath Pedroso garante que os argentinos conhecem mais de arte brasileira do que o contrário - apesar de vizinhos, temos contato apenas com alguns ‘artistas pingados’ da Argentina, entre eles, Jorge Macchi, Leandro Erlich e Tomás Saraceno, que volta e outra expõem aqui e são criadores de renome internacional. Por isso, a exposição "Argentina Hoy" (Argentina Hoje), que acaba de ser inaugurada no Centro Cultural Banco do Brasil, tem justamente como mote apresentar, primeiro em São Paulo e depois no Rio, um panorama da arte contemporânea dos criadores argentinos por meio das obras de 33 artistas. A mostra é de uma visada aberta e livre, dando espaço de respiro para cada trabalho.

"El Cuarto Rosa", fotografia do argentino Marcos López, que está em coletiva aberta hoje pelo CCBB

Mesmo assim, uma característica desponta ao ver a reunião das obras argentinas, a presença da figuração, vertente que não é surpreendente porque está em confluência com as criações de todo o mundo. É o dado figurativo que reúne os trabalhos da mostra, mais do que uma vontade de se criar um espaço para a procura de um diagnóstico de tendências da arte daquele país - apesar de a fotografia predominar. "A exposição tem duas vertentes, uma que trata do tema da cidade; a outra, das criações de mundos próprios, imaginários", diz Pedroso, que divide a curadoria da exposição com a curadora argentina Adriana Rosenberg.

Jorge Macchi, que em sua poética inteligente extrai de signos simples do cotidiano os motivos de suas obras, já afirmou que a entrada para as obras devem se dar pela porta visual - uma imagem figurativa - e não pela armadilha do "deciframento de uma ideia", e esse talvez seja um mote pensado por seus conterrâneos Mas é curioso perceber na exposição que a opção pela figuração na arte contemporânea argentina vem junto da constância de uma poética que carrega algo político entremeado, sendo essa ação por vezes mais delicada e intimista e por vezes mais explícita - como no vídeo de Ana Gallardo, no qual a artista, desalojada de sua casa em plena crise econômica, carrega seus pertences numa bicicleta tal fosse uma catadora de papel, ou nas pinturas excessivas de animais mortos de Mariana López. "A atmosfera política controversa da Argentina não poderia deixar de entrar nos trabalhos dos artistas", afirma o curador. A figuração, portanto, é maneira de marcar alguma posição.

Dentro dela, mesmo quando a vertente é a do mundo imaginário, não se trata de escapismo, pelo contrário. No cofre do CCBB, por exemplo, Marina De Caro apresenta a instalação "Entre Parêntesis", um espaço rosa, com desenhos feitos a pastel, e que tem ainda um tapete fofo de tecido no chão, só que com figuras humanas costuradas em si. Uma atmosfera delicada se faz dentro desse lugar imaginário, como se tudo estivesse em "um contínuo", "sem um limite", como diz a artista, completando que se trata de uma obra sobre o tema da imigração. "Quis criar um espaço que remetesse a ideia de se ter saído de um lugar para ir a outro, que vai chegar, sem que se deixe uma memória de lado", afirma ainda Marina. Erlich também faz uma menção política com sua instalação no primeiro piso, um jogo de espelhos e janelas que promove a ilusão de presença e ausência; e Silvia Rivas com videoinstalação trata de forma poética sobre a urgência.

Outra característica argentina que se percebe é uma recorrência de citações à história da arte. Nesse caso, chama a atenção, na entrada do CCBB, a pintura feita in loco por Leila Tschopp, "O Contexto sou Eu", a criação de uma paisagem arquitetônica de jogo de perspectivas que remete à obra metafísica de Giorgio De Chirico. Ainda nessa vertente, as fotografias encenadas de RES y Constanza Piaggio e de Nicola Costantino.

SERVIÇO:

"Argentina Hoy" - Centro Cultural Banco do Brasil - Rua Álvares Penteado, 112, Centro, 11 3113-3651 - 10 h/20 h (fecha 2.ª) - Grátis - Até 30/8.(AE)

segunda-feira, 6 de julho de 2009

II Concurso Mário Pedrosa de Ensaios sobre Arte e Cultura Contemporâneas Fundação Joaquim Nabuco

A Diretoria de Cultura da Fundação Joaquim Nabuco, por meio da Coordenação Geral de Capacitação e Difusão Científico-Cultural- CGCADIF, realiza o II Concurso Mário Pedrosa de Ensaios sobre Arte e Cultura Contemporâneas.

Constitui objeto do concurso a seleção em âmbito nacional de três ensaios, resultado de pesquisa inédita e original, elaborados desde disciplinas e pontos de vistas variados que versem sobre Arte e Mundo após a crise das utopias, tema escolhido nesta 2ª edição. O tema lançado pretende ser ao mesmo tempo objeto e circunstância para discussões mais específicas a serem desenvolvidas e apresentada.


Os três primeiros trabalhos considerados vencedores do concurso receberão prêmio individual em moeda nacional nos valores brutos de 30 mil reais, para o primeiro lugar; 20 mil reais, para o segundo; e 10 mil reais, para o terceiro.

As inscrições para o concurso são gratuitas e deverão ser realizadas por sedex ou pelos concorrentes ou seus procuradores no período de 10 de junho a 18 de setembro de 2009, das 9h às 12h e das 14h às 17h, no seguinte endereço: Fundação Joaquim Nabuco – Diretoria de Cultura. Rua Henrique Dias, 609, Derby – Recife-PE. CEP: 52.010-100. Tel.: (81) 3073-6659/6660.
Maiores informações no site: http://www.fundaj.gov.br

sábado, 4 de julho de 2009

FLIP: Sophie Calle x Grégoire Bouillier

Bouillier e a história de amor que virou ódio

Argelino mostra O Convidado Surpresa, sobre caso conturbado com Sophie Calle

Antonio Gonçalves Filho

O escritor argelino Grégoire Bouillier, de 49 anos, já foi andarilho, jornalista e pintor. Hoje é escritor premiado. Seu primeiro livro, Rapport Sur Moi (Relatório sobre Mim), publicado em 2002, rendeu a ele o Prix de Flore daquele ano e definiu o gênero que Bouillier usa ("relato") para se referir a O Convidado Surpresa (Cosac Naify, tradução de Paulo Neves, 120 págs., R$ 35), livro que o trouxe para a sétima edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Nesse relato, produzido há cinco anos, Grégoire Bouillier conta como conheceu a artista conceitual Sophie Calle, de quem se separou por e-mail, recebendo como resposta uma série de vídeos ultrajantes mostrados na Bienal de Veneza de 2007, em que ela pedia a famosas atrizes, performers, bailarinas e até a uma palhaça que interpretassem a mensagem de rompimento. Hoje, às 11h45, o casal volta a se encontrar numa mesa de debate, que promete lavar a roupa suja dessa relação artística e epistolar.

Bouillier conta que esteve presente à festa de lançamento desses vídeos e que foi interpelado por uma das mulheres. "Ela me provocou, dizendo que eu era bastante corajoso para estar lá." Bem, para quem pagou uma pequena fortuna por uma garrafa de Margaux Château de Tertri 1964 apenas para conquistar a mimada Sophie no dia em que a artista comemorava seus 37 anos, em 1990, coragem é o que não falta a Bouillier. Não que a tradição epistolar (mesmo que seja por correio eletrônico) exija do missivista uma dose excessiva de ousadia. A bem da verdade, a literatura francesa está cheia de rompimentos por cartas e livros autobiográficos em que a vida privada dos escritores é mais pública e devassada que nos atuais reality shows.

O escritor detesta a comparação. Diz que a relação dos dois não pode ser reduzida a um gênero que manipula a verdade como o reality show. Para ele, o relacionamento com Sophie Calle foi para valer. No livro O Convidado Surpresa, Bouillier conta como ficou emocionado ao receber, no dia da morte de Michel Leiris, um convite para ir à festa dela num sábado, 13 de outubro de 1990. Não podia imaginar que Sophie Calle fosse um dia fazer dessa relação amorosa um espetáculo público de ressentimento feminino, provocado por um ruído de comunicação. Ele jura que não pretendeu ser indelicado ao enviar a mensagem eletrônica dispensando a namorada. Esperava que ela respondesse ao e-mail. Como só existe uma coisa pior que uma mulher rejeitada - um homem humilhado -, Sophie Calle deu liberdade para outras mulheres lerem e interpretarem a mensagem, deixando Bouillier arrasado, especialmente porque a palhaça que lê a carta num dos vídeos da artista critica sua "sintaxe rudimentar".

"Acho que ela foi desonesta", sintetiza, "especialmente porque não revelou os antecedentes desse e-mail." Além disso, segundo Bouillier, ela o atingiu em seu ponto nevrálgico, sua atividade literária, dedicada a "elucidar a realidade por meio dela, exatamente como fez Virginia Woolf". As referências do escritor não abrigam nanicos, só gigantes da literatura, como James Joyce e Paul Valéry. A despeito disso, diz que a história da literatura tem apenas um pequeno papel em seu projeto literário, a autoficção, em que o autor faz uso de experiências pessoais para criar um espaço narrativo. "Meus livros não são romances nem obras memorialistas, apenas relatos", explica, embora seu mais recente lançamento, Cap Canaveral, conte a história de um escritor maduro e uma jovem admiradora. Autobiográfico? Sem dúvida. Por seguir o conselho literário de Michel Leiris, Bouillier jamais escreveria algo se não fosse para iluminar certas coisas

Elefante Branco se abriga em casarão

Artistas abrem hoje exposição nos Jardins, em que apresentam obras e promovem conversas com o público

fonte: O Estado de S. Paulo

Um casarão da década de 1930 vazio no nobre bairro paulistano do Jardim Europa é um "elefante branco" para a nossa época, mas, ao mesmo tempo, um espaço prolífico para abrigar uma exposição de arte contemporânea por seus cômodos e lugares (internos e externos) com obras que dialogam com sua arquitetura. Há cerca de um ano um grupo de artistas teve a ideia de ocupar a casa com uma mostra viva, que, a partir de hoje e até dia 26 pode ser vista, apresentando no local criações de Alexandre Fehr, Ana Paula Oliveira, Antônio Brasiliano, Cibele Lucena, Eduardo Verderame, grupo Esquizotrans, Flávia Sammarone, as irmãs Joana Traub Csekö e Júlia Csekö, Marcos Vilas Boas, Mônica Rizzolli, Peetssa, Renato Pera, Rodrigo Araújo e Túlio Tavares.


Pela própria definição do que o casarão representava, vazio, para esses artistas - e para qualquer um -, a exposição ganhou o nome de Elefante Branco, mas esse título ainda abre janelas de metáforas relacionadas ao sistema artístico, uma delas, a de que mostras têm se tornado espetáculos de caráter vultoso e inflado nas quais o que prevalece são conceitos de curadores e não as obras de arte em si, tampouco, a experiência do observador. Por isso, Elefante Branco tem o frescor de seu caráter experimental e de reflexão, já que também abarca a realização, aos sábados (a partir do dia 11), às 17 horas, de conversas abertas ao público com os participantes da mostra (têm entre 28 e 39 anos) e com os críticos André Mesquita, Cauê Alves, Fabiane Borges, Flávia Vivacqua e Ricardo Ramalho. "Artistas e pensadores são convidados a estabelecer diálogos entre si, estabelecer redes com corpos vivos e a casa, adensar a experimentação, expor o que está escondido: um movimento cultural como obra de arte", é a definição da ação por seus integrantes, como se pode ver no blog elefantebranco2009.wordpress.com.

O mais interessante desse "movimento cultural", organizado por Alexandre Fehr, Eduardo Verderame e Túlio Tavares é de que a ação não pretende ser uma afirmação de marginalidade, mas uma exposição plástica, com todos os seus códigos usuais e estrutura expositiva. "A exposição foi feita com cerca de R$ 2 mil a R$ 3 mil do grupo", conta Fehr. É um trabalho de colaboração, feito em rede, e, ao mesmo tempo, como diz Tavares, são mostras individuais dos artistas sem que cada um tenha pensado a relação com o espaço especial para criar sua obra (a casa, que pertence à família de um dos participantes, pode ser tratada como um amplo e temporário site specific).

O visitante/espectador pode, assim, adentrar na poética ou universo de cada uma das obras de Elefante Branco. Há os trabalhos de caráter político, como de Peetssa, Brasiliano e Verderame; os que tratam da questão da memória (até relacionada com o tema casa), de Flávia Sammarone e Júlia Csekö; desenhos intimistas de Mônica Rizzoli; ou a poderosa instalação escultórica de Ana Paula Oliveira.

Artistas criam obras a partir de escala doméstica

fonte: Folha de S. Paulo

Delson Uchôa e Rochelle Costi abrem individuais

Fotografia da série "Desmedida', de Rochelle Costi, em mostra

De frente para o Minhocão, uma mulher estende as roupas molhadas num varal do lado de fora da janela. Rochelle Costi fixou a imagem na memória como índice da escala que fabricou para a individual que abre hoje na galeria Luciana Brito.
"É o paradoxo entre a intimidade e a cena urbana", descreve Costi, 48. "A casa é feita numa escala que nos acolhe, mas dentro da metrópole nós somos sempre pequenos. A casa dela continua sendo a casa dela."
E Costi pegou emprestada uma casa em miniatura para fotografar as nove imagens da mostra. Vista sempre à luz do sol, até parece uma casa real, não fosse a escala contestada por objetos gigantes que ocupam a sala, o sótão, a entrada.
Uma cartela de anzóis parece ganchos de açougue, cartões-postais enfileirados viram grandes telas estocadas no porão, uma caixinha de couro toma o lugar de um enorme baú.
Na fotografia que chama de síntese da mostra, Costi deita a cabeça de uma boneca solitária na sala. Causa estranhamento o olhar artificial do pedaço de plástico, agigantado, faminto. É também parte do arsenal da artista na batalha por uma delicadeza torpe, uma disjunção de espaços que deixam vazar pelas frestas suas memórias afetivas.
"Sempre trabalho muito pensando na realidade", diz Costi. "Foram intervenções no espaço que eu registrei e que foram presenciadas só por mim, a casa como contêiner de tudo."
Buscando lastro para essa realidade, ela revela que usou câmeras analógicas e deixa ver até os tubos de negativos numa das imagens. Não há intervenções digitais, como se a fotografia de agora já tivesse perdido qualquer vínculo com o real.
Talvez pelo mesmo motivo, para não perder contato com o concreto, Delson Uchôa, que também abre individual hoje na Luciana Brito, faz questão de pintar sobre o piso de seu ateliê. "Você descola o couro do chão", diz Uchôa, 53. "É o espaço sitiado da pintura, ambiente impregnado de pigmento."

Membranas de pintura
Ele despeja resina acrílica sobre o piso do ateliê e depois descasca a tela do chão, juntando à obra o barro e a sujeira das lajotas. Foi dessa forma que fez os trabalhos agora expostos no pavilhão brasileiro da Bienal de Veneza.
Na galeria paulistana, mostra o díptico "Inverno/Verão", que expôs em março na Bienal de Havana. Com motivos construtivos, são telas do tamanho da sala do artista, uma em tons terrosos, quentes e a outra com formas cristalinas e azuladas.
"São duas membranas de pintura", descreve o alagoano.
"Entre uma e outra, há um campo magnético, a ideia de estar dentro do quadro, a pintura percebida em metros cúbicos."
Na casa diminuta e na sala que vira tela estão propostas antagônicas de um mundo medido em escala doméstica. Do exercício sutil das miniaturas aos excessos coloristas, salas, quartos, portas e porões dão as coordenadas dessa arquitetura caseira a serviço da estética -a cartela opaca da cidade contraposta aos gritos dos verões e invernos luminosos do Nordeste.

ROCHELLE COSTI e DELSON UCHÔA
Quando: ter. a sex., 10h às 19h; sáb., 11h às 17h; até 31/7
Onde: Luciana Brito Galeria (r. Gomes de Carvalho, 842, tel. 3842-0634)
Quanto: entrada franca